sábado, 26 de abril de 2008

A Bagagem Livresca

Pretende ser culto, tido como tal, ou ter apenas uma bagagem de leitura que o habilite a conhecer o mundo como ele foi consagrado pelos grandes autores de todo o mundo, através dos tempos? O que pode levar alguém a preocupar-se com se já leu muito, se leu o que está certo, ou o que é estar certo?“Todos sonhamos com uma espécie de ‘biblioteca ideal’, onde as criações mais altas e ainda vivas da cultura humana nos sejam acessíveis. Cada um de nós, se pode, investe numa tal biblioteca. Na falta dela, uma espécie de guia de leitura das chamadas obras-primas do passado, como este de Christiane Zschirnt, será sempre útil”, escreve Eduardo Lourenço no prefácio.Trata-se de uma selecção que reflecte um ângulo de visão, uma cultura, uma nacionalidade, aliás como o prefaciador também sublinha. No caso, trata-se de uma alemã, europeia, “ou antes, muito mittel-Europa”. O que faz privilegiar uns autores em prejuízo de outros. Logo a autora da selecção explica que “Fausto, a tragédia de Goethe, é a obra poética mais transcendente em língua alemã. Constitui o núcleo do acervo cultural alemão, serve de reserva de citações para qualquer ocasião, foi parodiada, representada, interpretada, estudada nas escolas, adaptada a banda desenhada e musicada.”E nós, a quem é proposta esta selecção tão da “Europa Central”, o que deveremos nós conhecer que se enquadre neste grau de representatividade da produção livresca portuguesa? A questão pôs-se, naturalmente , ao editor português, à semelhança do que acontecera com o castelhano e o brasileiro. A opção foi proceder a uma selecção própria, complementar, desafio que o jornalista Oscar Mascarenhas aceitou e concretizou.Do acervo nacional foi integrada nas “obras que nos mostram o mundo” a Peregrinação, de Fernão Mendes Pinto, que Oscar Mascarenhas classifica como “uma obra de arte, uma criação literária notável, que correu velozmente pelo mundo europeu logo após a sua publicação póstuma, em 1614”.E, também, quase inevitavelmente, lá está José Saramago entre os modernos, com o Memorial do Convento, “romance de viragem na carreira literária e estilo” do autor, “alegoria de uma paixão inesperadamente fiel de Vénus por Vulcano, num ambiente de trevas de superstição, medo e intolerância nos alvores do século XVIII português”.Mais livros de portugueses aqui elevados a incontornáveis: Almeida Garrett, Frei Luís de Sousa; Alexandre Herculano, Eurico, o Presbítero; Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição; Eça de Queiroz, Os Maias; Bocage, Poesias Eróticas, Burlescas e Satíricas; Agustina Bessa Luís, A Sibila; Eduardo Lourenço, Esplendor do Caos; Gil Vicente, Auto da Alma; Luís de Camões, Os Lusíadas; e Fernando Pessoa, Mensagem.Discutível como tudo, mas representativo.
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Christiane Zschirnt
Livros – Tudo o que é Preciso Ler
Casa das Letras
(Adaptação para a edição portuguesa de Oscar Mascarenhas)

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