terça-feira, 29 de abril de 2008

Tapete Vermelho para as crianças

Dizem por aí que a origem do costume de se estender um tapete vermelho para que pessoas importantes possam passar por ele vem de muitos anos. Séculos. E a questão não era exatamente O tapete e sim a sua cor. Segundo descobri por aí, na Antiguidade (cerca de 1000 a.C.), a cor púrpura, avermelhada, só era obtida em uma concha chamada porphura, que liberava esse pigmento quando atacada. Assim, mobilizavam-se centenas de empregados só para abrir as conchas e retirar a bolsa com tinta, o que a tornava extremamente cara. Por isso, só os nobres tinham condições de usá-las para tingir tecidos. O tapete vermelho era ainda mais caro porque, além do pigmento ser muito valioso, a feitura também era trabalhosa. Por indicar tanta riqueza, era a peça ornamental mais importante de um palácio.

Sem precisar gastar tantos tostões com a tal da concha e sem explorar a mais valia, Ana Paula e Edna compraram o material e encomendaram a uma costureira a confecção de um tapete vermelho para que nossas ilustres crianças ficassem mais a vontade. A sombra da árvore no jardim do Centro Comunitário da Criança ficou ainda mais acolhedora. Enquanto isso, nossa sala vai ganhando a estrutura necessária.

Foi assim, estendendo o tapete vermelho, que começamos as atividades no último sábado, 26 de abril. Ceilândia tinha um céu digno da fama do céu de Brasília. Azul, azulzinho com poucas nuvens. Este é só o terceiro reencontro. Ana Paula não pode ir. Edna, Célio e eu comandamos as atividades.

Para a mediação, pensei em comentar sobre a cobertura da imprensa sobre o caso Isabella Nardoni. Todas as crianças estavam por dentro do assunto. Algumas tinham até feito algum trabalho a respeito na escola. Ali, no mundinho deles, o caso é só mais um. Dia desses, dois deles me contaram uma história depois de uma canção:

Menina: - Eu tinha um tio que gostava de tocar violão.

Menino: - Ele era assim, gordinho, parecido com o senhor.

Menina: - Ele morreu num acidente de carro semana passada.

Menino: - Foi. Depois do acidente, deram seis tiros nele, dentro do carro.

Menina e Menino: - A gente sente uma saudade dele. Era um cara bem divertido.

E saíram para brincar enquanto eu fiquei com as músicas engasgadas na garganta.

Voltando para a mediação, escolhi A Verdadeira História dos Três Porquinhos para falar que tudo pode ter duas ou mais versões. E a gente acredita no que está mais próximo do que acreditamos e isso pode estar no grupo que veicula o fato (polícia, família, líderes religiosos, uma mídia mais confiável que outra, etc). A leitura e o papo foram um SUCESSO!!! As crianças foram se chegando... se chegando... se aconchegaram!!! Todos acompanharam de perto o “depoimento” do lobo Alex que justificava o acontecido com os três porquinhos como um mal entendido, pois o que ele queria mesmo era uma xícara de açúcar. Difícil foi acreditar na conversa de um lobo. O livro é ótimo. Um clássico. As crianças adoraram. Acho que qualquer dia vou arriscar ler O Livro dos Pontos de Vista (Ricardo Azevedo, Ática).
Empolgado com o sucesso do texto anterior, não resisti e li uma aquisição recente: Os três ladrões. O livro, originalmente lançado nos anos 70, havia sumido das prateleiras. Retornou às prateleiras este mês numa reedição da Global. Conta sobre três famigerados ladrões de carruagem que numa noite, durante um assalto, encontram na carruagem apenas uma menina, órfã, que iria para a casa de uma tia malvada. O trio resolve adotar a criança e outras mais que aparecem em seu caminho. Nossos meninos e meninas ficaram ligados na história, tentavam adivinhar o que aconteceria na página seguinte, corriam com os olhos em busca de guardar cada ilustração. Tensão na hora do encontro com a pequena órfã. Surpresa no desenrolar da história. Por fim, o alívio pelo final da história.
Algumas crianças resolveram ler para todos um dos livros que levaram para casa na semana passada. Jardson leu A Galinha Xadrez e deu início à leitura compartilhada. Depois, escolheram novos livros para o empréstimo. Foi neste momento que eu deixei florescer um sorriso. É que no final do ano passado um dos meninos não poderia mais participar do projeto como ouvinte. Era o Daniel. A idade já ultrapassava o limite. Mas ele não quis deixar os Roedores de Livros. Daí o meu riso florido. Daniel está novamente conosco, desta vez, ajudando na organização das crianças e na conferência dos livros emprestados e devolvidos. É mais um voluntário a serviço dos Roedores de Livros. Naquela manhã, sentado no tapete vermelho junto com tantas crianças e livros, vi que não apenas ajudamos a despertar o gosto pela leitura. Estamos também formando cidadãos. Hatuna Matata.

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