quarta-feira, 11 de março de 2009

Espiritismo Dialético, de José Herculano Pires

TRECHO:
A história do conhecimento é uma seqüência de erros, equívocos e frustrações. Este o motivo
por que Sócrates costumava explicar: “Só sei que nada sei, e que a filosofia começa quando
começamos a duvidar.” Outra coisa não tem feito o homem, desde as cavernas da era pré-lacustre,
do que errar para aprender. A história da civilização não é, portanto, somente a da luta de classes,
segundo o materialismo dialético, mas a própria história do erro. Como, entretanto, do erro, do
equívoco, da frustração, nasceram sempre e em todos os tempos o conhecimento e a sabedoria,
mais uma vez se comprova, no terreno do pensamento, o processo dialético da natureza, que do
pântano arranca os lírios, da larva a borboleta, do pecador o santo, do caos da sociedade capitalista
os contornos do socialismo.
Quando Demócrito firmou o princípio atômico da constituição do mundo, cometeu toda uma
série de erros, atribuindo à suposta partícula indivisível a diversidade de peso no vácuo, e dotando-a
de ganchos para a composição da matéria. Não obstante, havia descoberto, mais de trezentos anos
antes de Cristo, o segredo da constituição do mundo, que a física experimental só encontraria vinte
e quatro séculos depois.
Ao formular a base dialética da sua filosofia, Hegel unificou o “ser” e o “pensar” de Kant, mas
caiu no equívoco da “idéia universal”, espécie de encarnação filosófica do caprichoso deus
antropomórfico das religiões. Feuerbach teve a coragem de fazer a filosofia descer do empíreo
hegeliano à terra, para ligá-la às ciências naturais, mas caiu na frustração da “antropologia”,
novamente separando o “ser” do “pensar” e transformando este último numa simples função da
matéria. Não obstante, apoiados na dialética de Hegel e no materialismo de Feuerbach, Marx e
Engels criaram o materialismo dialético, dando novo impulso ao pensamento filosófico, abrindo
novas possibilidades à investigação dos processos históricos e sociais, oferecendo base científica às
aspirações do socialismo empírico.
Foram os gênios transformadores do século 19, tornando-se credores de todos os que — e
são a humanidade, — desfrutam hoje da possibilidade de uma caminhada mais rápida nos rumos da
civilização socialista. Stanley Jones, o grande missionário protestante, conhecido como “o cavaleiro
do Reino de Deus”, observa, em “Cristo e o Comunismo”, que Marx impulsiona a história, limpando o
templo da praga dos vendilhões, à semelhança do chicote do rabino, que ainda hoje espanta os
cristãos comodistas.
Entretanto, a filosofia que Marx e Engels ofereceram ao mundo, como a mais alta expressão
do conhecimento, não passa de uma forma híbrida, que se travestiu de síntese. A tese de Hegel e a
antítese de Feuerbach não se conjugam na moderna escolástica do materialismo dialético, pois ali
estão, sem dúvida, forçadas pela violência gráfica, duas palavras contraditórias e irredutíveis, que
não encontram caminho para o desenvolvimento da síntese. O materialismo é a porta fechada,
diante da qual se interrompe, abruptamente, o processo dialético de Hegel.
Marx condenou a “incapacidade burguesa” de Proudhon para compreender a lei fundamental
da dialética hegeliana, a “unidade dos contrários”, e chamou-o de falsificador, por ter feito a escolha
indébita de um dos contrários, a propriedade “boa”, rejeitando dessa maneira a própria dialética.
Mas, em compensação, — rejubile-se o espírito de Proudhon! — ele e Engels não fizeram outra
coisa. A luta dos contrários foi simplesmente frustrada na elaboração da dialética moderna, que se
formou pela mesma e indébita escolha de um dos contrários. O materialismo dialético considerou
“mau” o princípio espiritual, escolhendo como “bom” apenas o material. Por isso mesmo, não
obstante a enorme contribuição que trouxe à marcha do conhecimento, não é mais do que uma
tentativa de síntese.

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