O público mais difícil de motivar para a leitura é, tradicionalmente, o adolescente. Os comportamentos próprios desta fase de crescimento condicionam os jovens a interessar-se por si e pelos seus pares, mais do que por contextos que não os afectam directamente. Paradoxalmente, o mistério, o oculto, o exótico, têm um efeito semelhante ao que o auto-conhecimento provoca no adolescente. Serão estes os polos motivadores da leitura. Partindo deles, podemos explorar o humor, o sentido crítico, e até diversos estilos discursivos. Contudo, uma das condições fundamentais para motivar um adolescente para a leitura é conceder-lhe a autonomia da escolha. E, depois da motivação inicial, o mais difícil será gerir essa autonomia com a responsabilização. Fórmulas, não há.
Fica então a sugestão de um livro que poderá ser trabalhado com adolescentes.«Os da minha rua», de Ondjaki (Caminho), chegou há poucos dias às livrarias. Num estilo narrativo marcadamente oralizante e angolano, a gíria ocupa um lugar natural e vivifica as experiências da infância e adolescência do narrador, no seu quotidiano familiar e escolar. Cada pequena história é um episódio de afectos, reservando-se ao final um tom de doce melancolia. Apesar de não serem narrativas com as quais os adolescentes se identificarão de imediato, um livro como este tem algumas condições propícias para ser lido num clube de leitura ou numa comunidade de leitores para jovens a partir dos 15, 16 anos.
As histórias são curtas, o que é por si só apelativo. A sua dimensão permite aos leitores escolherem quais delas lhes interessarão, o que implica responsabilidade. Algumas das histórias poderão ser lidas em voz alta e discutidas nas sessões.
O contexto angolano poderá ser aprofundado a partir de conhecimentos prévios e com novas informações. O exótico desta diferença levá-los-á, por exemplo, a questões políticas, a hábitos de alimentação, a características espaciais...
A partilha das recordações do narrador com os leitores envolve-os num diálogo em que novas recordações surgirão, em hipotéticos textos produzidos pelos adolescentes, ou até, quem sabe, num portfólio fotográfico sobre a representação afectiva da rua de cada um, como a fotografia da capa sugere.
Tal como o romance «Bom dia, camaradas» (Caminho), este livro de estórias não pode ser catalogado como literatura juvenil. Ainda bem. Porque a ideia de que os adolescentes lêem livros para adolescentes é uma falácia, na medida em que os livros não se fazem segundo catálogos. E também cabe aos mediadores sugerir e divulgar junto dos jovens vários tipos de textos que não estejam fechados no limbo das colecções semi-trabalhadas ou simplificadas. Os adolescentes que lêem «A Lua de Joana» são os mesmos que lêem Harry Potter ou «O Código Da Vinci». E este fenómeno tanto se passa aos 13 como aos 20. Por isso, a nossa função, de leitores adultos, é de sugerir livros e aprender, no terreno, quais aqueles que agradam a uns ou a outros, e ir tentando sempre abrir novas portas de leitura, em partilha.
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