Os jornais já venderam com a história de Madeleine McCann, a desafortunada menina inglesa desaparecida há mais de um ano na Praia da Luz. E, se for caso disso, aí estarão, de novo, para a feira mediática. Mas o sentido de oportunidade quanto a lucros não se esgota a esse nível. À beira do arquivamento, o processo voltou a merecer a atenção, agora redobrada, com o aparecimento de livros sobre o tema.
Livros – a oportunidade da reflexão, da análise demorada, de jogar os factos, cogitar em quês e porquês, de deixar que o tempo complete o trabalho de clarificação. Livros escritos por quem esteve envolvido nas investigações – mais ainda se esperaria o arsenal de elementos que permitissem retomar a frio o novelo dos dias de manchetes inqualificáveis.
E os livros vão surgindo – na verdade, a tentação já tinha frutificado antes, pela mão de autores diversos. São apresentados em luzidas conferências de imprensa que potenciam o apetite de quantos almejam ser os destinatários únicos, ou pelo menos solitários, de uma verdade que lhes será ministrada por quem teve a proximidade do cheiro a cadáver. Quem melhor do que um polícia?
Deu em moda. O autor deste livro já foi inspector da Polícia Judiciária, andou em processos que lhe conferiram uma aura de saber, fora do senso comum, que nos abra os olhos. Por exemplo, ao que se diz na contra-capa, o caso Joana, ele igualmente lúgubre, deslindado em tribunal com sentença e tudo. Mas que sobra por aí, agora, com dúvidas quanto aos métodos de investigação – excessivamente violentos?
O autor saiu da corporação, tudo indica que para continuar no ramo civil da consultoria e investigação. E é nessa condição que ele pretende conferir à investigação conduzida pelos seus pares uma convicção que, cá para fora – mesmo aos seguidores menos atentos do folhetim – nunca teve. Ou seja, que desde o início a tese de rapto denunciada e alimentada sofregamente pelo casal McCain, não convenceu os polícias.
O autor reconhece, no entanto, que a perseverança nessa dúvida, ao mesmo tempo que a polícia secava todas as pistas e especulações, não levou muito longe. “Ainda não se sabe o que terá acontecido a Madeleine”, reconhece em nota prévia. Em todo o caso, “devido a questões legais”, não será ele a dizer quem foi que fez o quê.
Daí que ele tenha remetido para a tradicional sabedoria popular o desemaranhar da teia. Ou seja, deixa-o nas mãos deste “povo português” na Europa, “integrado, mas autodeterminado, ordeiro mas não cordeiro”. O mesmo povo, certamente, que chorou com os McCain e depois os apupou, como ele bem recorda.
Bom, e o que se sabe, depois de tudo? Na página 27, já Francisco, o abnegado e sacrificado protagonista, analisa para consigo mesmo a tese de rapto e conclui: “nããããããã”. E o caminho faz-se por aí. Terá razão? Quem sabe, o povo não se pronunciou e os tribunais também esperam pelos indícios, raciocínios, dúvidas acumulados pela investigação. Sobram os livros – para duvidar deles próprios e da Justiça?
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Paulo Pereira Cristóvão
A Estrela de Madeleine – Onde, Quando, Como, Quem, o Quê, Porquê
Editorial Presença, 12€
Livros – a oportunidade da reflexão, da análise demorada, de jogar os factos, cogitar em quês e porquês, de deixar que o tempo complete o trabalho de clarificação. Livros escritos por quem esteve envolvido nas investigações – mais ainda se esperaria o arsenal de elementos que permitissem retomar a frio o novelo dos dias de manchetes inqualificáveis.
E os livros vão surgindo – na verdade, a tentação já tinha frutificado antes, pela mão de autores diversos. São apresentados em luzidas conferências de imprensa que potenciam o apetite de quantos almejam ser os destinatários únicos, ou pelo menos solitários, de uma verdade que lhes será ministrada por quem teve a proximidade do cheiro a cadáver. Quem melhor do que um polícia?
Deu em moda. O autor deste livro já foi inspector da Polícia Judiciária, andou em processos que lhe conferiram uma aura de saber, fora do senso comum, que nos abra os olhos. Por exemplo, ao que se diz na contra-capa, o caso Joana, ele igualmente lúgubre, deslindado em tribunal com sentença e tudo. Mas que sobra por aí, agora, com dúvidas quanto aos métodos de investigação – excessivamente violentos?
O autor saiu da corporação, tudo indica que para continuar no ramo civil da consultoria e investigação. E é nessa condição que ele pretende conferir à investigação conduzida pelos seus pares uma convicção que, cá para fora – mesmo aos seguidores menos atentos do folhetim – nunca teve. Ou seja, que desde o início a tese de rapto denunciada e alimentada sofregamente pelo casal McCain, não convenceu os polícias.
O autor reconhece, no entanto, que a perseverança nessa dúvida, ao mesmo tempo que a polícia secava todas as pistas e especulações, não levou muito longe. “Ainda não se sabe o que terá acontecido a Madeleine”, reconhece em nota prévia. Em todo o caso, “devido a questões legais”, não será ele a dizer quem foi que fez o quê.
Daí que ele tenha remetido para a tradicional sabedoria popular o desemaranhar da teia. Ou seja, deixa-o nas mãos deste “povo português” na Europa, “integrado, mas autodeterminado, ordeiro mas não cordeiro”. O mesmo povo, certamente, que chorou com os McCain e depois os apupou, como ele bem recorda.
Bom, e o que se sabe, depois de tudo? Na página 27, já Francisco, o abnegado e sacrificado protagonista, analisa para consigo mesmo a tese de rapto e conclui: “nããããããã”. E o caminho faz-se por aí. Terá razão? Quem sabe, o povo não se pronunciou e os tribunais também esperam pelos indícios, raciocínios, dúvidas acumulados pela investigação. Sobram os livros – para duvidar deles próprios e da Justiça?
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Paulo Pereira Cristóvão
A Estrela de Madeleine – Onde, Quando, Como, Quem, o Quê, Porquê
Editorial Presença, 12€
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