TRECHO:
Prefácio
Realizaram, há tempos, uma enquete entre escritores e literatos para que respondessem "se a vida valia a pena ser vivida" e se eles próprios se consideravam realizados. Não se tratava do velho objetivo, até então perseguido, de considerar-se realizado quem "tivesse um filho, construísse uma casa e plantasse uma árvore", de tão prosaico que se apresenta, mas de saber através de pessoas de pensamento, de vida interior intensa, de observadores do comportamento dos indivíduos no meio em que trabalham e lutam, se depois de tanta labuta se consideravam recompensados pela obra realizada. Não se indagava de vantagens pecuniárias, de posições de destaque conquistadas, de recompensas monetárias adquiridas, mas pura e simplesmente de saber se estavam satisfeitos com a obra apresentada, fruto do esforço realizador empreendido, e, assim, se tinha valido a pena a existência decorrida. Na maioria, os consultados eram homens vividos, autores de livros aplaudidos nos meios social e cultural do país, quase todos membros da Academia Brasileira de Letras, nomes festejados no jornalismo, na cátedra, na literatura, escritores que tinham passado grande parte de suas existências debruçados sobre papéis e livros, no afã de gravar em palavras escritas ou pelas bocas de seus personagens em romances ou peças teatrais, os anseios e desencantos da vida das criaturas, responderam afirmativamente. Sim, a vida valia a pena ser vivida, concluíram eles - numa altura da vida em que a experiência adquirida no longo caminhar da justeza e equilíbrio aos julgamentos - mesmo com suas frustrações e desesperos, pelos quais todos passamos. Eles, principalmente, portadores de tão alta sensibilidade, que padecem da necessidade irreprimível de exteriorizar seus sentimentos, com a sofreguidão do náufrago que tentasse agarrar uma tábua atirada ao embate das ondas no mar revolto da vida. Todos responderam que sim. Bem que tinham eles seus sofreres, suas queixas, desilusões e desenganos, que transbordavam - de tantos que eram - para as páginas que
escreviam, para os versos que alinhavam, para as falas que marcavam as atitudes de seus personagens interpretando os fatos da vida. Mas, apesar de tudo que tinham sofrido, a beleza da vida os seduzira e seus encantos sobrepujaram as dores e ingratidões curtidas, cicatrizando mágoas e desesperanças. E transportavam para suas páginas a magnificência das madrugadas frescas ou a tristeza dos poentes sangüíneos, os exemplos de afetividade e amar das aves e dos animais, o desprendimento das flores, que desabrocham à beira dos caminhos para a glória de um dia de esplendor, para fenecerem sem que alguém reparasse nelas. Colaborando num periódico da Guanabara, a Sra. Maria Cottas, autora de dois livros, com várias edições, reaparece com esta coletânea de crônicas de épocas diferentes e sobre assuntos os mais díspares. Dotada de alta espiritualidade e dum poder de expressar com singeleza o brilho das idéias, a escritora não se restringe a exteriorizar seus sentimentos em face dos acontecimentos cotidianos, porque seus escritos são uma constante exaltação à Mulher, numa auto-defesa extremada, às vezes heróica, sempre enternecedora, a vislumbrar-se nas entrelinhas a sutileza feminina. Sob este aspecto a autora de Páginas Soltas excede a si mesma e suas crônicas, tão cheias de calor humano, tão impregnadas de sensibilidade da alma feminina, bem mereciam ser reunidas num volume, retiradas da vida efêmera dos periódicos, para a glória das bibliotecas. E como são crônicas escritas ao sabor dos acontecimentos, no desenrolar do cotidiano, nada mais são do que - Páginas Soltas. Setembro, 66. Othon Ewaldo
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
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