quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Os jovens e a leitura, a propósito do regresso às aulas

No notícias magazine (revista de domingo do Diário de Notícias) do último domingo a jornalista Cláudia Moura assina um artigo sobre os hábitos de leitura dos portugueses, com especial enfoque sobre os adolescentes. A propósito, cita números da OCDE, especialmente do PISA, e uma análise da professora e bibliotecária Manuela Barreto Nunes, cuja apresentação no último encontro Oeiras a Ler, mereceu diversas referências. (A súmula da apresentação pode ser vista aqui.)
De forma sumária, uma das principais questões levantadas prende-se com o facto dos jovens lerem noutros suportes, e não, como muitas vezes se defende, de simplesmente não lerem. Acontece que a relação com o livro se degradou, mas isso não significa que email, sms, chat, ou páginas de internet não sejam suportes de leitura.
Essa certeza traz novos desafios, sendo o primeiro como deverá o mediador comportar-se perante tal cenário? Deve apostar nestes suportes ou tentar cativar os adolescentes para o suporte mais tradicional?
Provavelmente assistimos a um conflito de gerações que em muito ultrapassa temas ou preferências. Os adultos de hoje não dominam as ferramentas preferencias dos jovens, e sentem por isso dificuldades acrescidas em promover a leitura recorrendo a estratégias tecnológicas.
Há um lapso entre a necessidade que o adulto sente e o prazer puro de conhecimento do jovem, que o leva a procurar mais e mais espaços e realidades virtuais.
Assim, uma parte da questão poderá ter uma solução se invertermos as posições de cada interveniente: se o professor, o bibliotecário ou o pai se colocar na posição de aprendiz, talvez consiga motivar o adolescente.
Mas paira no ar uma preocupação genuína: vamos deitar fora o inesgotável património que a leitura de ficção, poesia, teatro e não ficção oferecem ao leitor? O que vai acontecer se os pré-adolescentes se desligarem para sempre do livro? Será que um adolescente aceitará os e-books ou os audiobooks? Se assim for, apesar de tudo, a leitura de qualidade não está em risco.
Mas o desinteresse pela leitura de livros não deriva apenas da proliferação de suportes interactivos. A aceitação imediata destes suportes tem causas. A rapidez da comunicação é uma delas, já que permite ao adolescente estar em contacto permanente com o grupo, estar actualizado e integrado. Para além disso, abole regras formais, incentivando códigos cifrados, que muito lhes agrada. Depois, a velocidade que se imprime ao acesso à informação, com forte presença da imagem e do som, dá aos 'comunicantes' a impressão de que sabem tudo sem esforço, sem que seja necessário tempo e concentração.
No futuro, estes adolescentes não sofrerão, necessariamente, de iliteracia, mas poderão estar irremediavelmente instrumentalizados. Não há receitas. Mas há fenómenos que continuam a levar os jovens a ler, como a saga Harry Potter. E continua a haver jovens leitores. O livro não pode abandonar o espaço de visão dos adolescentes, mas nunca pode ser apresentado como melhor que a internet. Certo é que o prazer de ler é solitário e isso é muito difícil de reproduzir ou simular num processo de mediação. A partilha social acontece antes, durante e depois da leitura, mas não em simultâneo. Esse é um dos seus maiores entraves, e também o seu maior mistério. Há quarenta anos, um adolescente combatia momentos de tédio ou solidão com um livro (se os pudesse ter...), há vinte o livro competia com a televisão, hoje com o telemóvel, a televisão e o computador. Mas ainda compete.

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