São livros só de imagens, que comprovam a importância e autonomia do traço pictórico enquanto agente narrativo e simbólico. Tanto em O ovo e a galinha como em A árvore, Iela Mari explora a ideia de ciclo e de transformação, jogando com a alteração de pormenores em contextos macroestruturais.
No caso da galinha, a visão do animal é ampliada, de forma a que as penas do peito e as patas sejam o eixo central da narrativa, de onde nasce o ovo, e onde ele se esconde. Também esta visão parcial da mãe permite depois criar uma relação de dimensão com o pintainho ao longo do seu crescimento. Com um traço detalhado, também o desenho e o matiz das penas é significativo, já que a galinha é preta e branca e o pinto evoluirá de amarelo para esse tom. De uma simplicidade surpreendente, o cuidado com o detalhe é minucioso porque dele depende a relação entre todos os elementos compósitos da narrativa.
A história que lemos ao percorrer as páginas de A árvore pode ser a do esquilo, que está escondido logo na primeira imagem (sempre a ocupar as duas páginas), e desaparece na última. Mas este esquilo mais não é que uma das personagens que convivem com o ciclo das estações do ano, tal como os pássaros que chegam na Primavera, fazem ninho, permanecem no Verão e partem no Outono. Por isso a personagem principal tem direito a constar solitária no título: a árvore é o único elemento que permanece em todas as imagens, ora desfolhada, apenas com os ramos nus, ora verdejante como os campos, ora dourada e carmim. O ciclo confirma-se pelas características da árvore e do terreno, tanto quanto pelas movimentações dos animais (não é aleatória a escalada e descida dos ramos pelo esquilo). Mas o ritmo deste ciclo, quem no-lo dá são os níveis cromáticos que persistem da página anterior e interagem com outros que aparecem pela primeira vez. O regresso ao Inverno recupera os cinzas, menos azulados que no início, quando a Primavera se aproxima. Já os salpicos de dourado que encontramos na toca do esquilo, sabemo-lo depois, são frutos e folhas da árvore, que leva consigo na altura em que retorna à toca. Não há pressas neste processo, não há marcas nas imagens que as categorizem numa estação. Há apenas mudança, lenta no verde e no castanho, no adensar das ramagens, no crescer da erva, nos frutos que carregam os braços da árvore o nos pássaros que assistem ao voo desajeitado das crias. Sem movimento, é a árvore que confere tal dinamismo ao cenário em que se insere, como elemento congregador e seguro. O único que permanece.
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