quinta-feira, 26 de junho de 2008

O livro dos médiuns, ou, Guia dos médiuns e dos evocadores: espiritismo experimental, de Allan Kardec

Introdução
Todos os dias a experiência nos traz a confirmação de
que as dificuldades e os desenganos, com que muitos topam
na prática do Espiritismo, se originam da ignorância dos princípios
desta ciência e feliz nos sentimos de haver podido comprovar
que o nosso trabalho, feito com o objetivo de precaver
os adeptos contra os escolhos de um noviciado, produziu frutos
e que à leitura desta obra devem muitos o terem logrado
evitá-los.
Natural é, que entre os que se ocupam com o Espiritismo,
o desejo de poderem pôr-se em comunicação com os Espíritos.
Esta obra se destina a lhes achanar o caminho, levando-
os a tirar proveito dos nossos longos e laboriosos
estudos, porquanto muito falsa idéia formaria aquele que pensasse
bastar, para se considerar perito nesta matéria, saber
colocar os dedos sobre uma mesa, a fim de fazê-la mover-se,
ou segurar um lápis, a fim de escrever.
Enganar-se-ia igualmente quem supusesse encontrar
nesta obra uma receita universal e infalível para formar médiuns.
Se bem cada um traga em si o gérmen das qualidades
necessárias para se tornar médium, tais qualidades existem
em graus muito diferentes e o seu desenvolvimento
depende de causas que a ninguém é dado conseguir se ve-
rifiquem à vontade. As regras da poesia, da pintura e da
música não fazem que se tornem poetas, pintores, ou músicos
os que não têm o gênio de alguma dessas artes. Apenas
guiam os que as cultivam, no emprego de suas faculdades
naturais. O mesmo sucede com o nosso trabalho. Seu objetivo
consiste em indicar os meios de desenvolvimento da faculdade
mediúnica, tanto quanto o permitam as disposições
de cada um, e, sobretudo, dirigir-lhe o emprego de modo útil,
quando ela exista. Esse, porém, não constitui o fim único a
que nos propusemos.
De par com os médiuns propriamente ditos, há, a crescer
diariamente, uma multidão de pessoas que se ocupam
com as manifestações espíritas. Guiá-las nas suas observações,
assinalar-lhes os obstáculos que podem e hão de necessariamente
encontrar, lidando com uma nova ordem de
coisas, iniciá-las na maneira de confabularem com os Espíritos,
indicar-lhes os meios de conseguirem boas comunicações,
tal o círculo que temos de abranger, sob pena de fazermos
trabalho incompleto. Ninguém, pois, se surpreenda de
encontrar nele instruções que, à primeira vista, pareçam descabidas;
a experiência lhes realçará a utilidade. Quem quer
que o estude cuidadosamente melhor compreenderá depois
os fatos de que venha a ser testemunha; menos estranha lhe
parecerá a linguagem de alguns Espíritos. Como repositório
de instrução prática, portanto, a nossa obra não se destina
exclusivamente aos médiuns, mas a todos os que estejam
em condições de ver e observar os fenômenos espíritas.
Não faltará quem desejara publicássemos um manual
prático muito sucinto, contendo em poucas palavras a indicação
dos processos que se devam empregar para entrar em
comunicação com os Espíritos. Pensarão esses que um livro
desta natureza, dada a possibilidade de se espalhar profu-
samente por módico preço, representaria um poderoso meio
de propaganda, pela multiplicação dos médiuns. Ao nosso
ver, semelhante obra, em vez de útil, seria nociva, ao menos
por enquanto. De muitas dificuldades se mostra inçada a
prática do Espiritismo e nem sempre isenta de inconvenientes
a que só o estudo sério e completo pode obviar. Fora,
pois, de temer que uma indicação muito resumida animasse
experiências levianamente tentadas, das quais viessem os
experimentadores a arrepender-se. Coisas são estas com que
não é conveniente, nem prudente, se brinque e mau serviço
acreditamos que prestaríamos, pondo-as ao alcance do primeiro
estouvado que achasse divertido conversar com os
mortos. Dirigimo-nos aos que vêem no Espiritismo um objetivo
sério, que lhe compreendem toda a gravidade e não fazem
das comunicações com o mundo invisível um passatempo.
Havíamos publicado uma Instrução Prática com o fito
de guiar os médiuns. Essa obra está hoje esgotada e, embora
a tenhamos feito com um fim grave e sério, não a reimprimiremos,
porque ainda não a consideramos bastante completa
para esclarecer acerca de todas as dificuldades que se
possam encontrar. Substituímo-la por esta, em a qual reunimos
todos os dados que uma longa experiência e conscienciosos
estudos nos permitiram colher. Ela contribuirá, pelo
menos assim o esperamos, para imprimir ao Espiritismo o
caráter sério que lhe forma a essência e para evitar que haja
quem nele veja objeto de frívola ocupação e de divertimento.
A essas considerações ainda aditaremos outra, muito
importante: a má impressão que produzem nos novatos as
experiências levianamente feitas e sem conhecimento de causa,
experiências que apresentam o inconveniente de gerar
idéias falsas acerca do mundo dos Espíritos e de dar azo à
zombaria e a uma crítica quase sempre fundada. De tais reu-
niões, os incrédulos raramente saem convertidos e dispostos
a reconhecer que no Espiritismo haja alguma coisa de
sério. Para a opinião errônea de grande número de pessoas,
muito mais do que se pensa têm contribuído a ignorância e a
leviandade de vários médiuns.
Desde alguns anos, o Espiritismo há realizado grandes
progressos: imensos, porém, são os que conseguiu realizar,
a partir do momento em que tomou rumo filosófico, porque
entrou a ser apreciado pela gente instruída. Presentemente,
já não é um espetáculo: é uma doutrina de que não mais
riem os que zombavam das mesas girantes. Esforçando-nos
por levá-lo para esse terreno e por mantê-lo aí, nutrimos a
convicção de que lhe granjeamos mais adeptos úteis, do que
provocando a torto e a direito manifestações que se
prestariam a abusos. Disso temos cotidianamente a prova
em o número dos que se hão tornado espíritas unicamente
pela leitura de O Livro dos Espíritos.
Depois de havermos exposto, nesse livro, a parte filosófica
da ciência espírita, damos nesta obra a parte prática,
para uso dos que queiram ocupar-se com as manifestações,
quer para fazerem pessoalmente, quer para se inteirarem
dos fenômenos que lhes sejam dados observar. Verão, aí, os
óbices com que poderão deparar e terão também um meio de
evitá-los. Estas duas obras, se bem a segunda constitua seguimento
da primeira, são, até certo ponto, independentes
uma da outra. Mas, a quem quer que deseje tratar seriamente
da matéria, diremos que primeiro leia O Livro dos Espíritos,
porque contém princípios básicos, sem os quais algumas
partes deste se tornariam talvez dificilmente compreensíveis.
Importantes alterações para melhor foram introduzidas
nesta segunda edição, muito mais completa do que a primei-
ra. Acrescentando-lhe grande número de notas e instruções
do maior interesse, os Espíritos a corrigiram, com particular
cuidado. Como reviram tudo, aprovando-a, ou modificando-a
à sua vontade, pode dizer-se que ela é, em grande parte,
obra deles, porquanto a intervenção que tiveram não se limitou
aos artigos que trazem assinaturas. São poucos esses
artigos, porque apenas apusemos nomes quando isso nos
pareceu necessário, para assinalar que algumas citações um
tanto extensas provieram deles textualmente. A não ser assim,
houvéramos de citá-los quase que em todas as páginas,
especialmente em seguida a todas as respostas dadas às
perguntas que lhes foram feitas, o que se nos afigurou de
nenhuma utilidade. Os nomes, como se sabe, importam pouco,
em tais assuntos. O essencial é que o conjunto do trabalho
corresponda ao fim que colimamos. O acolhimento dado
à primeira edição, posto que imperfeita, faz-nos esperar que
a presente não encontre menos receptividade.
Como lhe acrescentamos muitas coisas e muitos capítulos
inteiros, suprimimos alguns artigos, que ficariam em duplicata,
entre outros o que tratava da Escala espírita, que já
se encontra em O Livro dos Espíritos. Suprimimos igualmente
do “Vocabulário” o que não se ajustava bem no quadro
desta obra, substituindo vantajosamente o que foi
supresso por coisas mais práticas. Esse vocabulário, além
do mais, não estava completo e tencionamos publicá-lo mais
tarde, em separado, sob o formato de um pequeno dicionário
de filosofia espírita. Conservamos nesta edição apenas
as palavras novas ou especiais, pertinentes aos assuntos
de que nos ocupamos.

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