segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Livros do Plano - A família que não cabia dentro de casa

A família que não cabia dentro de casa, Alexandre Honrado, Âmbar, livro recomendado para o 6º ano, 2º ciclo, leitura autónoma.

A escrita de Alexandre Honrado tem como arma o domínio das emoções prosaicas do quotidiano. A amplitude sociológica das temáticas exploradas (a indiferença dos pais em relação aos filhos, a toxicodependência, a gravidez na adolescência…) alicerça-se em apontamentos cómicos, jocosos ou reflexivos sobre o dia-a-dia comum dos adolescentes contemporâneos.
Ao contrário do que acontece em grande parte das obras de Alice Vieira, os protagonistas de Alexandre Honrado são paradigmas com que os jovens leitores facilmente se identificam. Por isso, nem sempre a gíria soa natural e na proporção adequada. Em Uma argola no umbigo (Âmbar), por exemplo, as alcunhas e os vícios discursivos da galeria de personagens adolescentes são de tal forma exageradas que podem suspender o efeito de humor desejado.
Já em A família que não cabia dentro de casa a narrativa surpreende pela originalidade temática e pelo ritmo que a estrutura confere aos acontecimentos. O exagero está aqui na situação e na cadência aumentativa do improvável, e esse é o verdadeiro elemento de humor da narrativa. Voltamos a encontrar uma personagem principal feminina, adolescente, com os juízos de valor próprios da idade, a curiosidade pelos outros, o encantamento por figuras excêntricas, o prazer em vivenciar momentos inesperados. A rapariga continua a empregar expressões cifradas, mas tem pouco tempo para dialogar com os seus pares, excepto a vizinha do andar de cima e sua melhor amiga, ‘Galochas’, que é a segunda pessoa a aparecer em sua casa, depois do anúncio de que a avó castelhana iria aportar ao lar, após fractura da perna numa estância de ski.
O que prende o leitor ao livro é a resposta à pergunta: quem vai aparecer a seguir? Esta é a história do livro: uma pacífica família nuclear (pai, mãe e filha) começa a receber pessoas em sua casa de forma totalmente inesperada e sucessiva ao longo de uma única noite. Neste contexto, revelam-se sentimentos, dissipam-se preconceitos e questionam-se atitudes. Para além da avó e da amiga que vai passar a noite a sua casa, há o conflito conjugal da sua madrinha, o primo que saiu da pensão e perdeu a sua namorada ucraniana numa rusga que a levou para a prisão, há ainda a prima Diana ‘Cabeça de Esfregão’, que espalha o terror em grafitis e não só na escola que ambas frequentam. É a partir do relato de Maria Ana que vamos acompanhando os diálogos dos pais, e as soluções improvisadas para resolver cada novo imprevisto. A avó, cujo anúncio de chegada dá início às hostilidades acaba por ficar para o fim, e a ida ao aeroporto transforma-se numa espécie de viagem de conciliação para todos. Claro que, devido ao atraso, não conseguem encontrar a avó…
O optimismo reina durante toda a narrativa, num ambiente cuja máxima será: é possível. Uma mensagem velada numa teia de figuras cómicas, mas que será tão do agrado quanto importante para o leitor. Trata-se da defesa da solidariedade, do respeito pela diferença, de não ajuizar sem tentar conhecer. Mas sem aquele tom moral que se impõe e anula o valor literário da narrativa, em prol de um didactismo ideológico que normalmente desrespeita o leitor e a sua leitura.
Não é um livro denso, complexo, com um vocabulário diversificado ou uma sintaxe elaborada. Não é um livro que tenda ao universal, mas é um livro bem conseguido, despretensioso, equilibrado e divertido.

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