O ano acordou quente em Brasília. Pelo menos para mim. Quente e preguiçoso. Uma sede danada. Não era ressaca do reveillon. Era calor, mesmo. Nada de interessante na TV. Nenhuma disposição para sair de casa. Resolvi apostar numa boa leitura. Dois livros da Lucia Hiratsuka estavam sobre a pilha de livros ao lado da estante: HISTÓRIAS TECIDAS EM SEDA (Cortez) e HISTÓRIAS DE MUKASHI (Elementar). Eles me dariam as boas vindas ao universo da literatura infantil em 2008. E assim foi.
Eu e Ana Paula conhecemos Lucia em São Paulo no primeiro dia do Seminário Prazer em Ler em agosto de 2007. Ela estava ao lado de Peter O’Sage e Renata Nakano. Coincidentemente, sentamo-nos juntos. Dela eu só conhecia a versão para Urashima Taro e havíamos visto o Histórias de Muiashi numa livraria e namoramos sua belíssima capa e ilustrações. Ela é um doce. Olhar atencioso ao fã insistente e sorriso desarmado na roda de amigos. Guarda o talento sob o corpo pequeno, esguio, tradicionalmente oriental. Mas, por suas ilustrações, imaginamos que se agiganta no estúdio como se um dragão marinho (um ryu) se apoderasse dos pincéis e das palavras. Em Histórias Tecidas em Seda, Lúcia selecionou três contos que têm o fino tecido como elemento. Hachikazuki conta sobre uma menina princesa que recebe um estranho presente no leito de morte de sua mãe. Tanabata é a lenda oriental sobre uma história de amor entre um homem e um ser encantado que é imortalizada numa festa tradicional que acontece até hoje, no mês de julho, chamada Festival das Estrelas. O Pássaro Poente revela que uma boa ação oferece suas recompensas. Tema que se repete em A Raposa e o Camponês, primeiro conto do livro Histórias de Mukashi, que é a palavra japonesa para antigamente. Outros cinco contos dão corpo à obra revelando personagens, ritos e crendices que habitam o imaginário do povo japonês. Coincidentemente, dois destes contos abordam a chegada do ano novo. Eu, que já havia me encantado com as ilustrações de Lucia Hiratsuka, me surpreendi com seu texto. Enxuto, simples, direto e bonito. Chega fácil no coração da criança e maravilha a todos. Em cada livro, um pequeno glossário introduz o leitor no universo fantástico do oriente. Foi uma bela surpresa para começar o ano.
Em 2008, teremos várias atividades culturais em homenagem ao centenário da imigração japonesa no Brasil. A cultura nipônica estará em alta. Aparecerá em exposições de arte, enredo de escola de samba carioca, festivais gastronômicos, etc. Por sua vez, Lucia, que desde pequena ouvia sua avó contar histórias do Japão e do Oriente, não espera por data alguma para falar de suas origens. Há muito reconta e ilustra com delicadeza e simplicidade a bela e tradicional cultura japonesa. Sua delicadeza e simplicidade são como água servida numa taça de cristal. Mata a sede de todos, com um toque de beleza. Neste primeiro dia do ano, quente e preguiçoso, bebi das palavras e imagens de Lúcia Hiratsuka. Matei a sede do primeiro dia. Sinto que beberei mais da sua arte. Hatuna matata.
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