Antes de deixar a minha opinião, aqui deixo os dois excertos que achei lindos, a maneira como estão escritos, como as palavras fluem sem haver muitos pontos finais, a simplicidade cheio de doçura, a poesia escondida na prosa:
“Mariana teve a noção exacta daquele momento mágico. Mesmo que quisesse não conseguia falar. Ele continuava a esculpi-la com as suas mãos de artista, machadas do seu ofício, tão doces, tão suaves, tão carregadas da imensa energia de ternura. Ela deixava-o fazer. Primeiro tinha os olhos abertos, depois fechou-os para o sentir melhor. Gemia de vez em quando, pequenos gemidos de entrega absoluta, mas era muito cedo, Inácio pensava demorar-se infinitamente naquele reconhecimento do seu território: o rosto, o pescoço, os ombros, os braços, o peito. O maravilhoso peito, sentido com a ponta dos dedos, os mamilos que se crispavam, ai, as dulcíssimas linhas do ventre. Que dizer daquele umbigo, tão fechadinho como uma rosa em botão. E logo a seguir a mancha escura do seu corpo, tapando a entrada das delícias pelas coxas unidas, era assim que ele queria, apalpou-lhe as pernas, fortes por montar a cavalo, os músculos desenvolvidos, e os pés, quentes, lindos, perfeitos, que não se conteve e beijou e começou a sua peregrinação de beijos em sentido contrário, agora as pernas, agora as coxas, o sexo, a barriga, o umbigo, a pele macia e fresca que se seguia até ao peito, ah, agora sim, a sua boca sentia a doçura daquele peito de virgem e logo o pescoço, as orelhas e, lentamente o rosto e a boca. Eram beijos serenos, naquele boca dos seus mais íntimos desejos, fê-la virar, e começo a descida pelas costas musculadas, abençoado cavalo, que assim esculpira a sua amada, o rabinho duro, pequeno, torneado, e de novo a virou e a sua boca estava no lugar certo, e agora não havia como não a beijar, ai, ai, dizia ela e, devagar, foi-se erguendo sobre aquele corpo de maravilha, só seu, e a sua Mariana que todos diziam arrapazada, recebeu-o na sua feminilidade total, gritou de alegria, procurou-lhe a boca, e abraçada a ele como uma náufraga, desfaleceu de prazer. "– pág 175
"É o vento que perpassa nas copas das laranjeiras, que vem do mar e traz as gaivotas. É o vento que faz oscilar as minhas cortinas, que se insinua como um segredo por entre os arbustos do jardim. É o vento que me conta histórias antigas, antigas como se fosse uma criança que não quisesse dormir. Não o ouves? Não. É o vento que sopra só para mim. É o vento manso, doce, da loucura, que me invade lentamente e me deixa à mercê dos seus dedos de nuvem, tão suaves e meigos. " – pag. 199
Foi o primeiro livro que li da Rosa Lobato de Faria. Dantes, estava com o pé atrás, desconfiada, incerta, mas lá peguei o livro para matar a dúvida e passar a ter certeza de uma vez por todas. Para ver se gosto ou não. Há que experimentar, aliás esta escritora é bastante falada e estimada entre as leitoras femininas (E os masculinos? Não sei.)
E surpreendeu-me! Deixei-me levar pela corrente da escrita e cheguei ao fim, podendo finalmente respirar-me.
É uma história diferente, com um toque de fantasia, em que uma mulher – a personagem principal – do sec. XXI recua ao passado, no inicio do sec XX, em 1908. Não é através da máquina do tempo ou algo assim. É outra coisa, "as esquinas do tempo". E aí podemos ver as diferenças daquele tempo e do agora. É fácil adivinhar, claro, toda a gente está informada, mas a história fala de famílias, de dramas, de amor. Contada com uma escrita muito própria da Rosa Lobato de Faria. Palavras flutuantes mas pesadas que as podemos sentir, palavras musicais que nos fazem embalar ou sorrir, palavras que até chegam a sangrar no papel como o caso da violência doméstica.
Mas, confesso, ao princípio achei um pouco confuso, em relação a duas Margaridas que se encontravam no mesmo ano temporal, mas em dois sítios diferentes: a Casa de Azenha e o Convento. Só comecei a perceber já a meio do livro…
Irei ler mais livros desta escritora, está garantido.
Classificação: 4/5
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