domingo, 2 de setembro de 2007

Cristo, de Pietro Ubaldi

PREFÁCIO


O presente volume é dividido em duas partes: a primeira diz respeito à "figura do Cristo", a segunda ao "Evangelho e problemas sociais". Do Cristo se fala freqüentemente nos 24 volumes da Obra. É assim que neste, que é o último deles, são expostos apenas os aspectos do tema não tratados anteriormente. Na segunda parte é exposta, deduzida do Evangelho, a doutrina de Cristo, sobretudo no seu aspecto social, que é o que mais interessa ao nosso mundo moderno.
Cristo e a sua doutrina são, neste volume, apresentados em forma diferente da tradicional, baseada no amar e no crer. Aqui, em vez, quisemos adotar a psicologia dos novos tempos, baseada no pensar e no compreender. Nos damos conta de que hoje vivemos em plena crise religiosa, que é crise de crescimento espiritual, pela qual o homem, de menino, se está tornando adulto, assumindo a respectiva forma mental. Acompanhamos este desenvolvimento apresentando um Cristo e sua doutrina, vistos com os olhos de um mundo mais maduro que entra na era da inteligência, pelo que ele não pensa mais com base nos impulsos instintivos do subconsciente, isto é, por sentimento e por fé, mas pensa consciente e controlado, seguindo a razão e o conhecimento.
Desta atitude nasceu um estilo que não é o do tradicional e cego conformismo, mas é de crítica que quer se dar conta de tudo. Expusemos, assim, ao leitor as mais variadas dúvidas, para apresentar-lhe depois a solução. Submetemos o Evangelho a esta crítica, mas para melhor compreender e não para demolir, para desbastar e chegar ao essencial e não para destruir, para encontrar o consistente que não cai com o tempo, e se alguma coisa cair, para reconstruí-la mais aderente à realidade. Esta franqueza poderá perturbar as velhas formas mentais. Mas, sem uma nova e mais substancial interpretação, o Evangelho pode em alguns pontos parecer inaplicável no mundo moderno e ser assim liquidado como doutrina inútil à vida. Procuremos, dessa forma — a risco de sermos julgados pouco ortodoxos — colocar-nos no momento histórico atual, que impõe em todos os campos uma renovação.
Depois disso procuramos colher no Evangelho, para lá da letra, o que não muda com o tempo, porque constituído segundo os princípios estabelecidos pela Lei de Deus. Um deles é o da evolução que leva à contínua superação de fases — da inferior à superior — no desenvolver-se da vida. A lei da evolução sobre a qual nos baseamos é um princípio biológico comprovado e universalmente aceito, e capaz de oferecer-nos uma sólida base para a interpretação do Evangelho. Pudemos, assim, eliminar a acusação de envelhecimento movida àquela Doutrina que caminha há dois mil anos.
Assim, enquanto o mundo está volvido a tudo contestar e demolir, aqui procuramos levar avante o trabalho positivo do construtor, sem o qual, à força de contestar, corremos o risco, de permanecer no vazio, sem as diretrizes, que são contudo necessárias à vida, ou por ficar somente com os deploráveis sub-rogados das diretrizes tradicionais, o que significa retrocesso involutivo em vez de progresso. Outrora usava-se o método do autoritarismo e da aquiescência; hoje tende-se ao da liberdade e responsabilidade. O Evangelho que foi dirigido ao homem menino de então, há de ser relido e entendido com a mente do homem adulto de hoje, situado perante problemas que não são mais os mesmos de então.
Isto não só é possível, pois, é a exigência de progresso imposta pela própria lei da vida que é a lei de movimento. O homem se ufana em apontar suas verdades como inalteráveis, mas inalterável é apenas o princípio da sua continua transformação. Todavia as verdades ditas absolutas são indispensáveis como referência e ponto final de chegada, e para dar um mínimo de estabilidade às posições que se sucedem ao longo do caminho, a fim de regular sua própria evolução. Isto implica, pois, relatividade de compreensão e de juízo, a respeito daquelas verdades. Assim o escandalizar--se é compreensível em relação à fase precedente mais atrasada, o que seria impossível se aquela fase não estivesse superada de maneira a poder ser vista e julgada a partir de uma fase mais avançada. Enquanto se vive mergulhando num dado plano de evolução do qual se faz parte, não se percebem as diferenças que permitem o confronto, porque elas só poderão ser vistas de um diferente ponto de vista; nem tampouco, podem perceber-se seus respectivos defeitos, porque não foram ainda experimentadas suas tristes conseqüências. Assim sendo, dado que naquele grau inferior tais defeitos servem à vida, eles podem ser julgados como virtudes, enquanto o que é moral num determinado nível poderá ser reputado imoral passando-se a um nível mais avançado. Permanecendo imbuídos de uma dada forma psicológica não podemos compreender certos atos como errôneos. Só quando se sair fora daquela "forma mentis" poderão os mesmos ser diversamente avaliados e, consequentemente, condenados e evitados.
Isto acontece em relação à própria posição biológica de cada sujeito e ao nível alcançado. Assim, por exemplo, o corajoso assaltante, outrora considerado como herói, porque útil para a conquista e a defesa, hoje se começa a considerá-lo um delinqüente, porque surgiu o conceito de pecado social, segundo o qual a virtude consiste, em vez, em não danificar o próximo. A evolução é uma construção na qual todos estamos trabalhando, elevando-nos assim, sempre mais.
Este volume sobre Cristo e sua doutrina acompanha, deste modo, os novos tempos, sendo racional e positivo para quem sabe pensar e quer compreender, sem excluir, antes, procurando levar a este nível quem segue a psicologia do sentimento e da fé. Aliás, livros deste tipo sobre Cristo não faltam. Mas aqui, em vez de contrapormos as suas formas mentais, procuramos conservar o bem e a verdade que existe na velha, iluminando-a com a nova em via de afirmação. Estamos, pois, em fase de transição e este livro a acompanha, procurando ajudar o novo a nascer do velho.
Alguns poderão escandalizar-se com afirmações que são, hoje, novas, mas que serão amanhã aceitas por todos. Na minha longa experiência de vida isso aconteceu repetidas vezes e o fato se repete com freqüência crescente. Assim este livro que poderá, hoje, parecer batalhador, tem porém a função de purificar; e se alguém poderá julgá-lo como condenatório, na realidade só visa a apontar o desenvolvimento. Todavia ele não é um livro de contemplação mas de luta, voltado, porém a um fim feliz, porque o trabalho de demolição — se tal possa parecer — finaliza-se com a reconstrução. O mesmo não se dirige a nenhum determinado grupo humano, e sim, à Lei, isto é, não visa à divisão, mas à unificação; por isso não tende ao separatismo, pois volve-se em direção ao Sistema. Com efeito, aquela Lei é apresentada em forma positiva, racionalmente controlável, não como abstração teológica ou mera aspiração mística, mas como realidade biológica que a todos nós estrutura e que se poderá experimentalmente analisar. É verdade que deste modo a figura do Cristo tende a ser em parte desmistificada, mas se algo se perde como criação de arte e beleza poética, em compensação, muito mais ela ganha em veracidade e portanto em aceitação.
Atinge-se assim uma interpretação do Cristo não só reservada a quem crê mas também a quem pensa: um Cristo para adultos visto não só pela fé mas também com a lógica e a razão, bem mais convincentes porque mais adequadas à mentalidade positiva do homem moderno; um Cristo que também o ateu pode levar em consideração, porque lhe é proposto sem esquecer os termos da sua forma mental. Tal universalidade de resultados conduz à unificação, o que é um progresso.
Assim este livro é uma tentativa para canalizar a revolução interior que já está em ato secundando-a, mas em forma de continuação do passado, de sua complementação e enriquecimento, no caminho da evolução. Apresentamos assim um Cristo logicamente implantado na estrutura físico-espiritual de nosso universo, de maneira que o homem novo possa continuar a utilizar, de forma mais adequada aos novos tempos, a idéia salvadora por Ele oferecida.
É assim que deixamos de lado o aspecto humano do Cristo, para vê-lo sobretudo em seu aspecto cósmico e divino, como representante do Pai, vindo para fazer-nos conhecer a sua Lei, para ensinar-nos e ajudar-nos a subir a Deus, levando-nos consigo do Anti-Sistema ao Sistema.

* * *

O presente volume representa o termo conclusivo de uma Obra em 24 volumes perfazendo cerca de 10.000 páginas. Trata-se de um longo caminho, do qual este escrito constituí-se na fase de maturação hoje alcançada — a guisa de coroamento — através de todo aquele percurso.
É o resultado de quarenta anos de trabalho, que vão de 1931 a 1971. Desenvolvem-se concomitantemente às transformações históricas deste período, do qual acompanhou o desenvolvimento que vai do velho conservadorismo estático ao nosso tempo de abertura. A Obra, antes que este chegasse, foi desde o seu início inspirada no espírito de renovação — hoje atual — sendo até — no começo - condenada por "erros" que não são mais, hoje, considerados como tais: e foi profética — a despeito de sua condenação — porque hoje se revela bem mais realizada de quanto não tivesse previsto. Podemos portanto acreditar que, resultando deste modo inserida no momento histórico atual, esta Obra tenha nascido em função do mesmo.
Podemos dizer, agora, que esta Obra está cumprida, bastando — para deduzi-lo — observar o ritmo musical segundo o qual ela se desenvolveu e agora se conclui. Ela nasceu no Natal de 1931 e terminou neste Natal de 1971. São exatamente quarenta anos, situados no centro do século XX, isto é, entre os primeiros trinta anos do início — de 1901 a 1931 — e os trinta anos depois da sua execução — de 1971 a 2.000 —. Estes quarenta anos podem dividir-se em dois períodos de vinte anos cada. — No primeiro deles foi escrita a "primeira obra", na Itália, até 1951, época da mudança de seu autor para o Brasil; no segundo período foi escrita a "segunda obra", no Brasil, até 1971.
A obra foi iniciada na metade da minha vida, isto é, aos quarenta e cinco anos. A minha vida de trabalho vai assim dos cinco aos oitenta e cinco anos. Na primeira metade, isto é, dos cinco aos quarenta e cinco, vão quarenta anos de preparação através de várias vicissitudes. A segunda metade vai dos quarenta e cinco aos oitenta e cinco anos e compreende quarenta anos de compilação da obra. Assim ela foi iniciada após um período de preparação igual ao de execução e precisamente na metade da minha vida, ou seja, aos quarenta e cinco anos.
Na introdução ao volume Profecias, terminado no Natal de 1955, apontei o ritmo dos quatro períodos de vinte anos que constituíam a minha vida. Observei então que o primeiro vai dos cinco aos vinte e cinco anos (1891-1911), o segundo dos vinte e cinco aos quarenta e cinco (1911-1931), o terceiro dos quarenta e cinco aos sessenta e cinco (1931-1951). Concluí assim que o último período da minha vida deveria ser dos sessenta e cinco anos aos oitenta e cinco anos (1951-1971). O controle da última parte desta contagem se podia fazer somente hoje.- Pois bem, ela sucedeu como fora previsto em 1955. Naquele ano escrevia no referido volume Profecias (Gênese da II Obra): "O atual quarto e último período da minha vida deveria durar até completar os meus oitenta e cinco anos. O meu trabalho deveria durar, aqui no Brasil, até o ano de 1971.
Uma outra coincidência: a Obra se iniciou com "Mensagens Espirituais" que vão de 1931 (Natal) a 1933 (Páscoa). Tais mensagens param nesse ano em que decorre o XIXº centenário da Morte de Cristo, para continuarem depois — à guisa de um ritmo decenal — com uma mensagem em 1943 e outra em 1953 (esta apareceu apenas na edição mais recente das Grandes Mensagens).
Uma tal harmonia não previsível e só percebida agora que ela aparece visível depois de terminado o trabalho, isto é, independente do meu conhecimento e vontade enquanto escrevia a Obra, faz pensar na presença de uma mente oculta, organizadora e diretora, e na harmonia que caracteriza a positividade da Lei nas suas obras de tipo benéfico .
Esta idéia me conforta. As teorias desenvolvidas na Obra as apliquei e vivi. E dado que as experimentei, sinto com justa razão que elas são verdadeiras. Dá-se, além disso, o fato de que, durante quarenta anos, e num mundo revolto pelas guerras, a Obra continuou a desenvolver-se, — eu diria com exatidão cronométrica — vencendo mil obstáculos, enquanto desmoronavam nações e desapareciam personagens que com esta mesma Obra tiveram relacionamento, e eu me transferia para o oposto hemisfério. Este fato revela que a Obra é sustentada por uma força interior e dirigida por um princípio ordenador que é típico da Lei e que com o acaso não se coaduna, pois este é desordem, incapaz, portanto, de manter uma tal ordem durante tão longo período. Ora, onde existe ordem deve existir uma Lei e, se como neste caso se verifica que ela não depende de nossa vontade, nem de cálculos e previsões, então não se pode deixar de pensar que esta mesma ordem provenha de uma outra fonte. Quem compreendeu a Obra bem sabe onde se encontra a ordem e de onde provem. Naturalmente poderá parecer ousado afirmá-lo. Com efeito, nos encontramos, aqui, perante um fato e é, pois, lícito e natural, se procurar uma explicação que satisfaça a razão e o sadio desejo de compreender.

Natal de 1971.


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