sexta-feira, 7 de setembro de 2007

O Livro dos Vampiros / Os Vampiros, de Jean-Paul Bourre

As leis do sangue
O vampirismo está sempre associado a um drama, uma maldição, uma
doença psíquica hereditária. Na epopéia negra e vermelha dos vampiros
apareciam casais amaldiçoados, homicidas megalômanos tais como o príncipe
VIad Drakul, grandes famílias atingidas por um mal misterioso, como os Bathory
ou os Cillei na Romênia do século XV.
Todos eles fascinados por uma espécie de vontade mórbida, rapidamente
transformada em neurose, em obsessão. Cultivam desejos dos mais
perturbadores, tais como Bárbara Cillei e seu irmão partilhando da mesma cama
ou VIad Drakul empalando os seus prisioneiros e fazendo-se servir de faustosas
refeições, entre cadáveres suspensos de lanças e piques.
Vive-se febril e loucamente a sexualidade e a morte. O leito nupcial torna-se
fúnebre pelas maldições e juramentos terríveis nele feitos. «Voltarei!...» Uiva
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Bárbara Cillei antes de morrer. Herman, seu irmão, invocará os demônios da
antiga magia para que a irmã ressuscite. As crônicas romenas da região da
Transilvânia afirmam que o êxito teria sido completo. Bárbara Cillei saiu do túmulo
visitando o castelo de Varazdin, onde tem a sua sepultura. Coincidências ou
epidemias diabólicas? Em 1936, na aldeia de Kneginecc – perto de Varazdin –
várias pessoas novas, rapariguitas, pereceram de maneira estranha. «Algumas
morreram em poucas semanas, em dois ou três meses no máximo, sem se lhes
conhecer qualquer doença. Todas tinham sobre a garganta duas ou três manchas
azuladas. Muitos destes jovens acordavam durante a noite atormentados por
horríveis pesadelos.»
O ritual do exorcismo praticou-se nas ruínas de Varazdin por um sacerdote
ortodoxo da igreja do Oriente. Rapidamente pararam as manifestações. Dizem os
velhos de Kneginec que o Grande Exorcista libertou a aldeia, mas ninguém
esclarece se os restos mortais de Bárbara Cillei, morta no século XV, foram ou
não exumados.
Os processos verbais que relatam os fenômenos vampirescos demonstramnos
através de que mecanismos o não morto se propaga e contamina quantos
leiam. Citemos por exemplo o inquérito conduzido pelo tenente Buttner, do
regimento de Alexandre de Vurtemberga, a 7 de Janeiro de 1732, o Visum et
Repertum, que intrigou Luís XV e o duque de Richelieu:
«Tendo ouvido dizer por mais de uma vez que na aldeia de Medwegga, na
Sérvia, os pretensos vampiros provocavam a morte de muita gente sugando-lhes
o sangue, recebi a ordem e missão, através do comando superior de Sua
Majestade, para que o caso fosse esclarecido beneficiando, para questão de
inquérito, do apoio de oficiais e de dois Unterfeldscherer.
»Perante o capitão da Companhia de Heiduques Gorschitz, Heiduck,
Burjaktar e os outros heiduques mais antigos do local, examinamos os fatos.
Estes, logo que interrogados, nos relataram unanimemente um caso ocorrido,
havia cinco anos, com um heiduque da região (um heiduque é um membro da
nobreza local) chamado Arnold Paul que ao cair do carro de feno partira o
pescoço. Mais tarde, passados alguns anos, teria contado repetidas vezes ter sido
vítima de um vampiro, perto de Casanova, na Pérsia turca.1[1]
»Teria por esse fato resolvido comer alguma terra no túmulo de um vampiro,
esfregando-se com o sangue do mesmo, uma vez ser voz corrente evitar assim a
maléfica influência. Todavia, vinte ou trinta dias após a sua morte havia gente a
queixar-se que Arnold Paul os atormentava, chegando mesmo a matar quatro
pessoas. Para que se acabasse com este perigo, o heiduque aconselhou os
habitantes dessa região a desenterrarem o vampiro e assim foi, quarenta dias
depois da morte deste. Encontraram-no em perfeito estado de conservação; a
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carne não decomposta, os olhos injetados de sangue fresco que também escorria
do nariz e dos ouvidos, sujando-lhe a camisa e a mortalha. As unhas das mãos e
pés estavam soltas, e novas unhas cresciam em seu lugar, pelo que se concluiu
tratar-se de um arqui-vampiro. Assim, segundo a norma do sítio, atravessaram-lhe
o coração com uma estaca.
»Mas enquanto se procedia a esta ação, jorrou do corpo uma enorme
quantidade de sangue, acompanhada de um lancinante grito. Nesse próprio dia foi
queimado, e as cinzas lançadas ao túmulo. Aquela gente afirmava que as vítimas
dos vampiros transformam-se, por sua vez, em vampiros. Por tal razão se decidiu
proceder da mesma forma para com os quatro corpos atrás referidos.
»O caso não ficou por aqui porque o dito Arnold Paul atacara não só pessoas
mas também gado!
»Aqueles que diziam ter comido carne de animal contaminado e que disso
vieram a morrer ficaram presumíveis vampiros, tanto que no espaço de três
meses, (em dois ou três dias) sem nenhuma doença previamente detectada,
pereceram dezessete pessoas das idades mais diversas.
»Heiduque Joika faz saber que a sua nora, Staha Joica, tendo-se deitado
quinze dias antes de perfeita saúde, soltou durante a noite um grito medonho,
acordou em sobressalto tremendo de medo, queixando-se de ter sido ferida no
pescoço por um homem, filho do heiduque Milloe, que morrera havia quatro
semanas. Desde então definhando hora a hora, morria oito dias depois.
»Por todas estas coisas nessa mesma tarde, depois de ouvidas as
testemunhas, fomos ao cemitério acompanhados pelo heiduque da aldeia, para
que se abrissem os túmulos suspeitos e se observassem os corpos.
»Esta investigação revelou os seguintes fatos:
»– Uma mulher de nome Stana, ao dar um filho à luz e no seguimento de
uma curta doença de três dias, morreu aos 20 anos e 3 dias confessando que,
para se livrar de toda a espécie de influências, se esfregara com sangue de
vampiro. O seu estado de conservação era excelente. Aberto o corpo descobriu-se
uma grande quantidade de sangue fresco na cavitate pectoris.
»– Miliza, uma mulher com 60 anos que morreu após três meses de doença e
enterrada noventa e tal dias depois, tinha ainda uma quantidade de sangue em
estado líquido.
»– Os oficiais do rei enumeram ainda onze pessoas da mesma aldeia, mortas
em circunstâncias estranhas mantendo sangue fresco e concluem a seguir, no seu
relatório: ‘Depois de devidamente registrado o que atrás foi exposto, ordenamos à
ciganagem que passava que decapitassem todos esses vampiros. Foram
queimados os corpos e espalhadas as cinzas por Morávia, enquanto, devolviam
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aos caixões, os corpos encontrados em estado de decomposição.’ EU AFIRMO e
os Unterfeldscherer, QUE TODAS AS COISAS SE PASSARAM TAL COMO
ACABAMOS DE RELATA-LAS, em Medwegya, na Sérvia, a 7 de Janeiro 1732.»
Assinatura: os oficiais do rei... As testemunhas. Belgrado, 26 de Janeiro
1732.

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