As adultas participantes na acção deste fim de semana, em Mirandela, eram mães atentas e interessadas em motivar os filhos para a leitura. Algumas delas, professoras do 1º ciclo, vinham também com algumas curiosidades de foro profissional, nomeadamente em relação à apresentação de livros infantis. Uma das questões abordada foi a da escrita. Da mesma forma que a relação com a leitura se transforma ao longo do crescimento, também a escrita parece afugentar os pré-adolescentes. Foram pelo menos três mães a partilhar a sua experiência: filhos curiosos e imaginativos, que tinham por hábito escrever espontaneamente a agora não o fazem com a mesma regularidade, ou que não produzem textos com a mesma qualidade quando estes são pedidos na escola, ou até que sempre escreveram poesia e agora abandonaram o género.
Discutimos o assunto e pareceu-nos possível criar um paralelo com a leitura.
O desafio de juntar letras, depois palavras, de acordo com uma ordem de sentido é um desafio que muitas crianças aceitam com entusiasmo. Começam a ganhar autonomia face ao escrito, que lhes possibilita descodificar e criar mensagens... é um poder imenso e desejado desde os tempos em que dependiam dos mediadores para chegar aos livros e a outras instruções. A relação com a fantasia, se foi sempre estimulada pelos mediadores, pode agora ser construída pelas próprias crianças, que se divertem criando personagens e mundos de aventura, tal como fazem quando brincam. Por volta dos 10, 12 anos, as crianças começam a abandonar as antigas brincadeiras e a despertar para outros interesses, de acordo com as novas experiências que vão tendo. Também os seus limites de compreensão se estendem, e assim alcançam universos até então desconhecidos. Ora, a produção escrita, enquanto reflexo do seu imaginário e dos hábitos quotidianos, sofre alterações. Estando ela associada à infância, deixa de fazer sentido, permanecendo nos mesmos moldes. Do mesmo modo como tentamos dar aos pré-adolescentes livros que vão ao encontro das suas exigências e os possam surpreender, também na produção do escrito devemos procurar alternativas às histórias de aventuras ou aos poemas. Porque não oferecer um diário, um caderno em branco para que o pré-adolescente escreva os seus projectos, guarde os seus segredos e confissões? Ou porque não incentivar um blogue para o seu grupo de amigos, onde todos possam colocar a música que estão a ouvir, registar a letra, uma fotografia, um comentário? Às vezes tendemos a lidar com o escrito como com o livro, no sentido da criação literária. E vemos o desinteresse dos pré-adolescentes pela escrita que vinham praticando como o desinteresse pela escrita, tout court. A escrita é um processo, um treino, uma manifestação. O que dela resulta é o menos importante. Por muito que as crianças escrevessem muito bem até há um ano ou dois, não podemos acalentar o sonho de que irão sempre escrever assim. Importante é escrever, não abandonar o processo e o gosto pelo acto, seja em suporte de papel, seja em suporte electrónico, seja num registo, seja noutro completamente diferente.
No decurso da reflexão conjunta, partilhámos esta convicção. E, não fora os exemplos concretos, aqueles que só conhecemos pelo diálogo, não teríamos nós próprios pensado muito no assunto. As acções são enriquecedoras por isso, são todas diferentes entre si, e em todas acontece algo que nos permite continuar a pensar.
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