«Há depois um outro tipo de adaptação que é, a meu ver, um verdadeiro acto de censura (devo dizer que a Literatura Infantil é muito mais vítima de censura do que a Literatura, justamente porque é considerada por alguns como literatura pedagógica).
Adaptar uma obra para uma criança é transformá-la adequadamente, é dar-lhe aquilo que ela não possui originalmente; muitas vezes, isso significa expurgá-la de aspectos eventualmente nefastos, ao nível da moral, da religião e da política. Por exemplo, até há poucos anos, as ideias antinacionalistas ou antipatrióticas deveriam ser eliminadas. A obra adaptada deveria (deverá) estar de acordo com as concepções oficiais de ordem, de moral, de ética, etc. Em certa medida, os livros que interessam às crianças e que não foram escritos propriamente a pensar nelas, ao sofrerem adaptações deliberadas, nesta perspectiva de censura, como que são novamente (re)escritos com um destinatário preciso. Passam de "livros-receptor" a "livros-destinatário". (...)
Em qualquer caso, adaptar uma obra com o pretexto de não traumatizar as crianças pode ser, quanto a mim, uma atitude abusiva, senão mesmo hipócrita porque, quase sempre, não preside ao acto censor a preocupação com a criança, mas sim alguns dos nossos piores preconceitos.» (pp. 45-48)
Manuel António Teixeira Araújo, A emancipação da Literatura Infantil, Campo das Letras
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