domingo, 14 de junho de 2009

Revista Espírita - Jornal de Estudos Psicológicos - DÉCIMO-SEGUNDO ANO – 1869

TRECHO:
ESTATÍSTICA DO ESPIRITISMO.
Um recenseamento exato dos espíritas seria coisa impossível, como já dissemos,
por uma razão muito simples, que é que o Espiritismo não é nem uma associação, nem
uma congregação; seus adeptos não são inscritos em nenhum registro oficial. É muito
bem reconhecido que se lhe poderia avaliar a quantidade pelo número e a importância
das sociedades, freqüentadas somente por uma ínfima minoria. O Espiritismo é uma
opinião que não exige nenhuma profissão de fé, e pode espalhar no todo ou em parte os
princípios da Doutrina. Basta simpatizar com a idéia para ser espírita; ora, esta qualidade
não sendo conferida por nenhum ato material, e não implicando senão obrigações morais,
não existe nenhuma base fixa para determinar o número dos adeptos com precisão. Não
se pode estimá-lo senão de maneira aproximada pelas relações e pela maior ou menor
facilidade com a qual a idéia se propaga. Esse número aumenta cada dia numa proporção
considerável: é um fato positivo reconhecido pelos próprios adversários; a oposição
diminui, prova evidente de que a idéia encontra mais numerosas simpatias.
Compreende-se, aliás, que não é senão pelo conjunto, e não sobre o estado das
localidades consideradas isoladamente, que se pode basear uma apreciação; há, em
cada localidade, elementos mais ou menos favoráveis em razão do estado particular dos
espíritos e também das resistências mais ou menos influentes que ali se exercem; mas
esse estado é variável, porque tal localidade que se mostrou refratária durante vários
anos, de repente torna-se um foco. Quando os elementos de apreciação tiverem adquirido
mais precisão, será possível fazer um mapa colorido, sob o aspecto da difusão das idéias
espíritas, como é feito para a instrução. À espera, pode-se afirmar, sem exagero, que, em
suma os números dos adeptos centuplicou há dez anos, apesar das manobras
empregadas para abafar a idéia, e contrariamente às previsões de todos aqueles que
estavam se gabando de tê-lo enterrado. Este é um fato adquirido, e do qual é preciso bem
que os antagonistas tomem seu partido.
Não falamos aqui senão daqueles que aceitam o Espiritismo com conhecimento de
causa, depois de o terem estudado, e não daqueles, bem mais numerosos ainda, nos
quais essas idéias estão no estado de intuição, e aos quais não falta senão poder definir
suas crenças com mais precisão e de lhe dar um nome para serem espíritas confessos. É
um fato bem averiguado, que se constata cada dia, há algum tempo sobretudo, que as
idéias espíritas parecem inatas numa multidão de indivíduos que jamais ouviu falar de
Espiritismo; não se pode dizer que tenham sofrido uma influência qualquer, nem seguido
o impulso de uma associação. Que os adversários expliquem, se o podem, esses
pensamentos que nascem fora e ao lado do Espiritismo! Não seria certamente um
sistema preconcebido no cérebro de um homem que teria produzido um tal resultado; não
há prova mais evidente de que essas idéias estão na Natureza, nem de melhor garantia
de sua vulgarização no futuro e de sua perpetuidade. Deste ponto de vista pode-se dizer
que os três quartos, pelo menos, da população de todos os países possuem o germe das
crenças espíritas, uma vez que se as encontra naqueles mesmos que lhe fazem
oposição. A oposição, na maior parte, vem da idéia falsa que se fazem do Espiritismo;
não o conhecendo, em geral, senão pelos ridículos quadros que dele fez a crítica
malevolente ou interessada em denegri-lo, recusam com razão a qualidade de espíritas.
Certamente, se o Espiritismo se parecesse às pinturas grotescas que dele têm feito, se se
compusesse de crenças e de práticas absurdas que lhe quiseram emprestar, seríamos o
primeiro a repudiar o título de espírita. Quando, pois, essas mesmas pessoas souberem
que a Doutrina não é outra senão a coordenação e o desenvolvimento de suas próprias
aspirações e de seus pensamentos íntimos, elas o aceitarão; incontestavelmente, são
futuros espíritas, mas, à espera, não os compreendemos nas avaliações.
Se uma estatística numérica é impossível, há uma outra, talvez mais instrutiva, e
pela qual existem os elementos que nos são fornecidos em nossas relações e em nossa
correspondência; é a proporção relativa dos Espíritas segundo as profissões, as posições
sociais, as nacionalidades, as crenças religiosas, etc., levando em conta que desta
circunstância que profissões, como os oficiais ministeriais, por exemplo, são em número
limitado, ao passo que outras, como os industriais e os capitalistas, são em número
indefinido. Toda proporção guardada, podem-se ver quais são as categorias onde o
Espiritismo encontrou, até este dia, mais adeptos. Em algumas, a proporção pôde ser
estabelecida a tanto por cento com bastante precisão, sem pretender, todavia, que ela o
seja com rigor matemático; as outras categorias foram simplesmente classificadas em
razão do número de adeptos que elas nos forneceram, começando por aquelas que deles
contam mais, e cuja correspondência e as listas de assinatura da Revista podem dar os
elementos. O quadro adiante é o resultado do levantamento de mais de dez mil
observações.
Constatamos o fato, sem procurar nem discutir a causa dessa diferença, o que
poderia, no entanto, ensejar o assunto de um estudo interessante.
PROPORÇÃO RELATIVA DOS ESPÍRITAS.
I. Sob o aspecto das nacionalidades. - Não existe, por assim dizer, nenhum país
civilizado da Europa e da América onde não haja espíritas. Aquele em que são mais
numerosos, são os Estados Unidos
da América do Norte. Ali seu número é avaliado, por uns, em quatro milhões, o que
já é muito, e, por outros, em dez milhões. Esta última cifra é evidentemente exagerada,
porque compreenderia mais de um terço da população, o que não é provável. Na Europa,
essa cifra pode ser avaliada em um milhão, no qual a França figura com mais ou menos
seiscentos mil. Pode se estimar o número de espíritas do mundo inteiro em seis a sete
milhões. Quando não fosse senão a metade, a história não oferece nenhum exemplo de
uma doutrina que, em menos de quinze anos, tenha reunido um semelhante número de
adeptos, disseminados sobre toda a superfície do globo. Se nisso se compreendessem os
espíritas inconscientes, quer dizer, aqueles que não o são senão por intuição, e se
tornarão mais tarde espíritas de fato, somente na França, poder-se-iam contá-los vários
milhões.
Do ponto de vista da difusão de idéias espíritas, e da facilidade com que são aceitas,
os principais Estados da Europa podem ser assim classificados como se segue:
1 ° França. - 2° Itália. - 3° Espanha. -4° Rússia. - 5° Alemanha. -6° Bélgica. -7°
Inglaterra. -8°- Suécia e Dinamarca. -9° Grécia. -10° Suíça.
II. Sob o aspecto do sexo; sobre 100: homens, 70; -mulheres, 30.
III. Sob o aspecto da idade', de 30 a 70 anos, máximo; - de 20 a 30 anos, número
médio; - de 70 a 80, mínimo.
IV. Sob o aspecto da instrução. O grau de instrução é muito fácil de apreciar pela
correspondência; sobre 100: instrução cuidada, 30; -simples letrados, 30; - instrução
superior, 20; - meio letrados, 10; -iletrados, 6; - sábios oficiais, 4.
V. Sob o aspecto das idéias religiosas; sobre 100: católicos romanos, livres
pensadores, não apegados ao dogma, 50; - católicos gregos, 15;-judeus, 10; protestantes
liberais, 10; católicos apegados aos dogmas, 10; - protestantes ortodoxos, 3; -
muçulmanos 2.
VI. Sob o aspecto da fortuna; sobre 100: mediocridade, 60; -fortunas médias: 20; -
indigêncía, 15; - grandes fortunas, 5.
VII. Sob o aspecto do estado moral, abstração feita da fortuna, sobre 100: aflitos, 60;
- sem inquietação, 30; - felizes do mundo, 10; -sensualistas, 0.
VIII. Sob o aspecto da classe social. Sem poder estabelecer nenhuma proporção
nesta categoria, é notório que o Espiritismo conta entre seus adeptos: vários soberanos e
príncipes reinantes; membros de famílias soberanas, e um grande número de
personagens titulados.
Em geral, é nas classes médias que o Espiritismo conta mais adeptos; na Rússia, é
quase que exclusivamente na nobreza e a alta aristocracia; foi na França que se
propagou mais na pequena burguesia e na classe operária.
IX. Estado militar, segundo o grau: 1° tenentes e sub-tenentes; - 2° sub-oficiais; - 3°
capitães; - 4° coronéis; - 5° médicos e cirurgiões; - 6° generais; - 7° guardas municipais; -
8° soldados da guarda; - 9° soldados da linha.
Nota. Os tenentes e sub-tenentes espíritas estão quase todos em atividade de
serviço; entre os capitães, os há em torno da metade em atividade, e a outra metade
aposentada; os coronéis, médicos, cirurgiões e generais aposentados estão em maioria.
X. Marinha; 1 ° marinha militar; - 2° marinha mercante.
XI. Profissões liberais e funções diversas. Nós os agrupamos em dez categorias,
classificadas segundo a proporção dos adeptos que elas forneceram ao Espiritismo.
1° Médicos homeopatas. - Magnetistas (1). (1) A palavra magnetizador revela uma idéia de
ação; a de magnetista uma idéia de adesão. O magnetizador é aquele que exerce por profissão ou outro
modo; pode-se ser magnetista sem ser magnetizador. Dir-se-á: um magnetizador experimentado, e um
magnetista convicto.
2° Engenheiros. - Professores primários; senhores e senhoras de pensão. -
Professores livres.
3° Cônsul. - Padres católicos.
4° Pequenos empregados. - Músicos. -Artistas líricos. -Artistas dramáticos.
5° Porteiros. - Comissários de polícia.
6° Médicos alopatas. - Homens de letras. - Estudantes.
7° Magistrados. -Altos funcionários. - Professores oficiais e dos liceus. - Pastores
protestantes.
8° Jornalistas. - Artistas pintores. - Arquitetos. - Cirurgiões.
9° Notários. -Advogados. -Procuradoresjudiciais.-Agentesde negócios.
10° Agentes de câmbio. - Banqueiros.
XII. Profissões industriais, manuais e comerciais, igualmente agrupadas em dez
categorias.
1 ° Alfaiates. - Costureiras. 2° Mecânicos. - Empregados de estradas de ferro. 3°
Operários tecelões. - Pequenos negociantes - porteiros. 4° Farmacêuticos. - Fotógrafos. -
Relojoeiros. - Viajantes de comércio.
5° Agricultores. - Sapateiros.
6° Padeiros. - Açougueiros. - Salsicheiros.
7° Marceneiros.-Opera rios tipógrafos.
8° Grandes industriais e chefes de estabelecimentos.
9° Livreiros. - Impressores.
10° Pintores de edifícios. - Pedreiros. - Serralheiros. - Merceeiros. - Domésticos.
Deste levantamento, resultam as conseqüências seguintes:
1° Que há espíritas em todos os graus da escala social;
2° Que há mais homens do que mulheres espíritas. É certo que, nas famílias
divididas pela crença com respeito ao Espiritismo, há mais maridos contrariados pela
oposição de suas mulheres do que mulheres pela de seus maridos. Não é menos
constante que, em todas as reuniões espíritas, os homens estão em maioria.
É, pois, erradamente que a critica pretendeu que a Doutrina é recrutada
principalmente entre as mulheres por causa de sua tendência ao maravilhoso. Ao
contrário, é precisamente essa tendência ao maravilhoso e ao misticismo que as torna,
em geral, mais refratárias do que os homens; essa predisposição fá-las aceitarem mais
facilmente a fé cega que dispensa todo exame, ao passo que o Espiritismo, não admitindo
senão a fé raciocinada, exige a reflexão e a dedução filosófica para ser bem
compreendido, e ao que a educação estreita dada às mulheres, as torna menos aptas do
que os homens. Aqueles que sacodem o jugo imposto à sua razão e ao seu
desenvolvimento intelectual, freqüentemente, caem num excesso contrário; elas se
tornam o que elas chamam as mulheres fortes, e são de uma incredulidade mais tenaz;
3° Que a grande maioria dos espíritas se encontra entre as pessoas esclarecidas e
não entre as ignorantes. Por toda a parte o Espiritismo se propagou de alto o baixo da
escala social, e em nenhuma parte desenvolveu-se em primeiro lugar nas classes
inferiores;
4° Que a aflição e a infelicidade predispõe às crenças espíritas, em conseqüência
das consolações que elas proporcionam. É a razão pela qual, na maioria das categorias,
a proporção dos espíritas está em razão da inferioridade hierárquica, porque é ali que há
mais necessidades e sofrimentos, ao passo que os titulares das posições superiores
pertencem, em geral, à classe dos satisfeitos; é preciso deles excetuar o estado militar
onde os simples soldados figuram em último lugar.
5° Que o Espiritismo encontra um acesso mais fácil entre os incrédulos em matérias
religiosas do que entre aqueles que têm uma fé retida;
6° Enfim, que depois dos fanáticos, os mais refratários às idéias espíritas são os
sensualistas e as pessoas das quais todos os pensamentos são concentrados sobre as
posses e os gozos materiais, qualquer seja a classe a que pertençam, o que é
independente do grau de instrução.
Em resumo, o Espiritismo é acolhido como um benefício por aqueles que ele ajuda a
suportar o fardo da vida, e é repelido ou desdenhado por aqueles que ele dificulta no gozo
da vida. Falando-se deste princípio, explica-se facilmente a classe que ocupam, nesse
quadro, certas categorias de indivíduos, apesar das luzes que são uma condição de sua
posição social. Pelo caráter, gostos, hábitos, gênero de vida das pessoas, pode-se julgar
antecipadamente sua aptidão em assimilar as idéias espíritas. Em alguns, a resistência é
uma questão de amor-próprio, que segue quase sempre o grau do saber; quando esse
saber lhes fez conquistar uma certa posição social que os coloca em evidência, não
querem convir que puderam se enganar e que outros podem ter visto mais justo. Oferecer
as provas a certas pessoas é lhes oferecer o que elas mais temem: e de medo de
reencontrá-las fecham os olhos e os ouvidos, preferem negar a priorie se abrigar atrás de
sua infalibilidade, da qual estão bem convencidas, o que quer que disso digam.
Explica-se menos facilmente a causa da classe que ocupam, nessa classificação,
certas profissões industriais. Pergunta-se, por exemplo, porque os alfaiates ali ocupam a
primeira classe, ao passo que a livraria e a imprensa, profissões bem mais intelectuais,
estão quase em último. É um fato constatado há muito tempo, e do qual ainda não nos
demos conta.
Se, no levantamento acima, em lugar de não compreender senão os espíritas de
fato, se tivessem considerado os espíritas inconscientes, aqueles em que essas idéias
estão no estado de intuição e que fazem o Espiritismo sem o saber, várias categorias
teriam sido certamente classificadas diferentemente; os literatos, por exemplo, os poetas,
os artistas, em uma palavra, todos os homens de imaginação e de inspiração, os crentes
de todos os cultos estariam, sem nenhuma dúvida na primeira classe. Certos povos, entre
os quais as crenças espíritas são, de alguma sorte, inatas, ocupariam também um outro
lugar. É por isto que essa classificação não poderia ser absoluta, e se modificará com o
tempo.
Os médicos homeopatas estão à frente das profissões liberais, porque, com efeito, é
aquela que, guardadas as proporções, contém em suas fileiras o maior número de
adeptos do Espiritismo; sobre cem médicos espíritas, há ao menos oitenta homeopatas.
Isto se prende a que o próprio princípio de sua medicação os conduz ao espiritualismo;
também os materialistas são raros entre eles, se bem que os há, ao passo que são
numerosos entre os alopatas. Melhor do que estes últimos compreenderam o Espiritismo,
porque encontraram nas propriedades fisiológicas do perispírito, unido ao princípio
material e ao princípio espiritual, a razão de ser de seu sistema. Pelo mesmo motivo, os
espiritas puderam, melhor do que os outros, se darem conta dos efeitos desse modo de
tratamento. Sem ser exclusivo com relação à homeopatia, e sem rejeitar a alopatia,
compreenderam a sua racionalidade, e os sustentaram contra os ataques injustos. Os
homeopatas, achando novos defensores nos espíritas, não tiveram a imperícia de atirarlhes
a pedra.
Se os magnetistas figuram na primeira classe, no entanto, depois dos homeopatas,
apesar da oposição persistente e freqüentemente acerba de alguns, é que os opositores
não formam senão uma pequeníssima minoria junto à massa daqueles que são, pode-se
dizer, espíritas de intuição. O magnetismo e o Espiritismo são, com efeito, duas ciências
gêmeas, que se completam e se explicam uma pela outra, e das quais aquela das duas
que não quer se imobilizar, não pode chegar a seu complemento sem se apoiar sobre a
sua congênere; isoladas uma da outra, elas se detêm num impasse; elas são
reciprocamente como a física e a química, a anatomia e a fisiologia. A maioria dos
magnetistas compreendem de tal modo por intuição a relação íntima que deve existir
entre as duas coisas, que se prevalecem geralmente de seus conhecimentos e
magnetizam, como meio de introdução junto aos espíritas.
De todos os tempos, os magnetistas estiveram divididos em dois campos: os
espiritualistas e os fluidistas; estes últimos, muito menos numerosos, fazendo ao menos
abstração do princípio espiritual, quando não o negam absolutamente, tudo relacionam
com a ação do fluido material; conseqüentemente, estão em oposição de principio com os
espíritas. Ora, há que se observar que, se todos os magnetistas não são espíritas, todos
os espíritas, sem exceção, admitem o magnetismo. Em todas as circunstâncias, deles se
fizeram os defensores e os sustentáculos. Deveram, pois, se admirar de encontrar
adversários, mais ou menos malevolentes, naqueles mesmos dos quais vinham reforçar
as fileiras; quem, depois de ter sido, durante mais de meio século alvo aos ataques, às
zombarias e às perseguições de todas as espécies lançam a seu turno, a pedra, os
sarcasmos e, freqüentemente, a injúria aos auxiliares que lhes chegam, e começam a
pesar na balança por seu número.
De resto, como o dissemos, essa oposição está longe de ser geral, muito ao
contrário, pode-se afirmar, sem se afastar da verdade, que ela jamais está na proporção
de mais de 2 a 3 porcento sobre a totalidade dos magnetistas; ela é muito menor ainda
entre aqueles da província e do estrangeiro do que de Paris.

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