Eis o segundo livro que me fez chorar!
António, menino travesso, sabe de duas coisas: a primeira é que o vizinho da frente é um homem poderoso, importante, nada menos que o Presidente do Conselho, António de Oliveira Salazar. A segunda é que ele, António, tem o mesmo nome. Esperam os pais que a mesma sorte.
Gente pobre e humilde, António é criado no Vimeiro à sombra da grande casa da família Salazar, até ao fatídico dia em que o pai de António, único sustento da casa, morre prematuramente. António é obrigado a deixar a escola e a tomar a rédea do destino da família. Desde cedo aprende a sustentar a família revelando-se também um rapaz inteligente.
Pouco antes do falecimento do pai, rebenta a guerra em África e Portugal vê-se a braços com uma guerra que se julga de fácil resolução. No Vimeiro a mesma é vista como sendo uma “coisa” feita lá muito longe e que nunca chegará aquele pedaço de terra do interior. No entanto a guerra arrasta-se e António, menino e moço quando a guerra estala (1961) vê o seu nome nas listas de incorporação e, poucos meses depois, embarca no célebre navio Niassa para Angola.
Júlio Magalhães, com este livro, dá-nos uma visão muito realista de vários importantes factos da nossa História: o de um Portugal oprimido, atrasado e rude, dominado por um regime autoritário e conservador que amordaçava quem ousasse sequer pensar. É comum ler expressões como “as paredes têm ouvidos” ou “aqui não se falam destes assuntos”. Um país triste de gente triste, mergulhado na superstição, no temor à igreja, cheio de mitos que, digo eu, nunca se libertou. O autor explora, e muito bem, expressões tão usuais hoje em dia como “o que os vizinhos vão dizer”, ou “parece mal”. Ou seja, Júlio Magalhães consegue explanar e transmitir-nos uma imagem bem real e nítida de uma nação cheia de mitos, superstições, medos, vergonhas, onde tudo se fazia para parecer bem (tal como hoje em dia).
É assim, neste contexto, que surge o grande tema do livro: A Guerra de Ultramar.
E Júlio Magalhães tenta exorcizar fantasmas, quebrar tabus que ainda hoje se mantêm. Uma vez mais expressões como “tudo isto para quê?”, “em nome de quem esta guerra?”. O sofrimento do homem comum, inculto, rude, que se vê arrancado da sua terra e da sua família para ir combater para uma terra que não lhe diz absolutamente nada e que, lá chegando, se depara com atrocidades que desconhecia por completo, pois as notícias que a censura deixa passar, transmitem uma guerra cheia de facilidades, quase um passeio onde os únicos mortos se devem a acidentes de viação…
O autor consegue transmitir todas essas imagens de uma forma muito viva e realista. É doloroso sentir o sofrimento e a saudade de milhares de homens, simbolizados em António e outros soldados, que, a milhares de quilómetros, se apoiavam uns nos outros, surgindo assim amizades fortíssimas, para toda a vida, que, para qualquer um de nós, é difícil de entender.
No meio deste principal tema, o autor descreve-nos uma belíssima história de amor que se inicia na infância e que se prolongará pela eternidade, no entanto, a meu ver, o que torna o livro um excelente livro, embora a história de amor seja terna e bela, é, forçosamente o acontecimento que atolou o país de 1961 a 1974 e que lançou milhares de jovens portugueses para o desconhecido e que tantos traumas causou e causa.
A técnica narrativa de Júlio Magalhães é um misto de ficção com realidade. É óbvio que o autor se baseia em factos verídicos e histórias pessoais reais. Muda os nomes e cria os diálogos, mas todo contexto é real e, mais importante, representa milhares de homens e famílias que se reverão nesta obra.
Algo que também sobressai é a pintura de uma Angola dominada pelos portugueses onde, excepto no mato, se vivia bem e de uma forma tranquila e acomodada. E depois, quando os portugueses começam a debandada, a imagem de uma Angola destruída, feia, em plena guerra civil, onde a tranquilidade desaparece para dar lugar ao caos e à destruição. Fica clara uma crítica expressa num grito de mágoa assente no personagem Brito sobre a forma como o processo de independência foi realizado, que, insatisfeito afirma: “a guerra ainda não acabou” ou “depois de tanta coisa entregarmos as colónias desta forma?”.
Como senão apenas posso referir a previsibilidade da história de amor. Desde o início percebi ser aquele amor intemporal e, em momento algum pensei que os acontecimentos pudessem ser diferentes. Porém, repito, o interesse do livro está na explanação da Guerra de Ultramar, um assunto tabu, uma época que necessita, que merece ser esclarecida e debatida de uma forma séria e honesta pela sociedade portuguesa.
Sem preconceitos ou reservas, estamos diante de um excelente livro.
António, menino travesso, sabe de duas coisas: a primeira é que o vizinho da frente é um homem poderoso, importante, nada menos que o Presidente do Conselho, António de Oliveira Salazar. A segunda é que ele, António, tem o mesmo nome. Esperam os pais que a mesma sorte.
Gente pobre e humilde, António é criado no Vimeiro à sombra da grande casa da família Salazar, até ao fatídico dia em que o pai de António, único sustento da casa, morre prematuramente. António é obrigado a deixar a escola e a tomar a rédea do destino da família. Desde cedo aprende a sustentar a família revelando-se também um rapaz inteligente.
Pouco antes do falecimento do pai, rebenta a guerra em África e Portugal vê-se a braços com uma guerra que se julga de fácil resolução. No Vimeiro a mesma é vista como sendo uma “coisa” feita lá muito longe e que nunca chegará aquele pedaço de terra do interior. No entanto a guerra arrasta-se e António, menino e moço quando a guerra estala (1961) vê o seu nome nas listas de incorporação e, poucos meses depois, embarca no célebre navio Niassa para Angola.
Júlio Magalhães, com este livro, dá-nos uma visão muito realista de vários importantes factos da nossa História: o de um Portugal oprimido, atrasado e rude, dominado por um regime autoritário e conservador que amordaçava quem ousasse sequer pensar. É comum ler expressões como “as paredes têm ouvidos” ou “aqui não se falam destes assuntos”. Um país triste de gente triste, mergulhado na superstição, no temor à igreja, cheio de mitos que, digo eu, nunca se libertou. O autor explora, e muito bem, expressões tão usuais hoje em dia como “o que os vizinhos vão dizer”, ou “parece mal”. Ou seja, Júlio Magalhães consegue explanar e transmitir-nos uma imagem bem real e nítida de uma nação cheia de mitos, superstições, medos, vergonhas, onde tudo se fazia para parecer bem (tal como hoje em dia).
É assim, neste contexto, que surge o grande tema do livro: A Guerra de Ultramar.
E Júlio Magalhães tenta exorcizar fantasmas, quebrar tabus que ainda hoje se mantêm. Uma vez mais expressões como “tudo isto para quê?”, “em nome de quem esta guerra?”. O sofrimento do homem comum, inculto, rude, que se vê arrancado da sua terra e da sua família para ir combater para uma terra que não lhe diz absolutamente nada e que, lá chegando, se depara com atrocidades que desconhecia por completo, pois as notícias que a censura deixa passar, transmitem uma guerra cheia de facilidades, quase um passeio onde os únicos mortos se devem a acidentes de viação…
O autor consegue transmitir todas essas imagens de uma forma muito viva e realista. É doloroso sentir o sofrimento e a saudade de milhares de homens, simbolizados em António e outros soldados, que, a milhares de quilómetros, se apoiavam uns nos outros, surgindo assim amizades fortíssimas, para toda a vida, que, para qualquer um de nós, é difícil de entender.
No meio deste principal tema, o autor descreve-nos uma belíssima história de amor que se inicia na infância e que se prolongará pela eternidade, no entanto, a meu ver, o que torna o livro um excelente livro, embora a história de amor seja terna e bela, é, forçosamente o acontecimento que atolou o país de 1961 a 1974 e que lançou milhares de jovens portugueses para o desconhecido e que tantos traumas causou e causa.
A técnica narrativa de Júlio Magalhães é um misto de ficção com realidade. É óbvio que o autor se baseia em factos verídicos e histórias pessoais reais. Muda os nomes e cria os diálogos, mas todo contexto é real e, mais importante, representa milhares de homens e famílias que se reverão nesta obra.
Algo que também sobressai é a pintura de uma Angola dominada pelos portugueses onde, excepto no mato, se vivia bem e de uma forma tranquila e acomodada. E depois, quando os portugueses começam a debandada, a imagem de uma Angola destruída, feia, em plena guerra civil, onde a tranquilidade desaparece para dar lugar ao caos e à destruição. Fica clara uma crítica expressa num grito de mágoa assente no personagem Brito sobre a forma como o processo de independência foi realizado, que, insatisfeito afirma: “a guerra ainda não acabou” ou “depois de tanta coisa entregarmos as colónias desta forma?”.
Como senão apenas posso referir a previsibilidade da história de amor. Desde o início percebi ser aquele amor intemporal e, em momento algum pensei que os acontecimentos pudessem ser diferentes. Porém, repito, o interesse do livro está na explanação da Guerra de Ultramar, um assunto tabu, uma época que necessita, que merece ser esclarecida e debatida de uma forma séria e honesta pela sociedade portuguesa.
Sem preconceitos ou reservas, estamos diante de um excelente livro.
Classificação: 5
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