quarta-feira, 5 de março de 2008

Retrato de Dorian Gray (O) - Oscar Wilde



Nascido em Dublin no dia 16 de Outubro de 1854, Oscar Wilde teve uma educação esmerada, vindo a formar-se na famosa Universidade de Oxford cerca de 20 anos depois.
Reconhecido como um excepcional poeta e ensaísta, Wilde era também um homem que tinha consciência da sua inteligência e do fascínio que provocava no público, ao ponto de ter afirmado na alfândega, aquando da sua chegada a Nova Iorque, ”Nada tenho a declarar, excepto o meu génio”.
Levando uma vida relativamente calma, chegando mesmo entre 1887 e 1889 e dirigir uma revista feminina, foi precisamente nesse espaço de tempo que escreve os poucos contos que produziu e o seu único romance, justamente o ”Retrato de Dorian Gray”, e é curioso porque é devido a esse seu único romance que a sua vida se irá alterar de uma forma trágica, levando-o mesmo á sua ruína.
Por altura de 1893, época onde Wilde estreia algumas peças de teatro, conhece Lord Alfred Douglas, que havia ficado fascinado com o romance de Wilde. Dessa amizade nasce uma relação amorosa que levaria o pai de Alfred Douglas, o marquês de Queenberry, a condenar aquela relação, insultando Wilde e um processo que acabaria com a acusação e condenação de Oscar Wilde à prisão pelo crime de homossexualidade.
Aí ficou preso durante dois anos, altura em que escreve uma longa carta de amor a Lord Alfred, que viria a ser publicada em 1905 com o título de ”De Profundis”.
Sendo libertado em 1897, viu-se completamente arruinado. Abandonado pela família, com a reputação completamente destruída, viveu da caridade dos seus poucos amigos até falecer em 1900 em Paris, de meningite, num quarto de hotel, completamente só. Morria assim, um dos grandes génios da literatura que o mundo já teve.
Conhecido e assumido como homossexual, numa época onde isso era tido como um desvio de personalidade, uma anormalidade, Wilde cria uma grande escândalo com a publicação de o ”Retrato de Dorian Gray”, sendo acusado pela opinião pública de ”expor uma ambígua personalidade na figura do seu protagonista”, ou seja, este livro foi visto e foi tido, penso que ainda o é, como um dos ícones da “cultura” homossexual.
Pessoalmente penso que Oscar Wilde pretendeu de facto criar um conjunto de relações entre os personagens que leva a uma leve percepção que, aquelas relações de amizade, são mais do que isso, pois ele, de uma forma muito inteligente, efectua todo um jogo de palavras, de frases que indiciam precisamente relações de maior intimidade entre os personagens.
No entanto este livro parece-me mais um exame à consciência humana e principalmente um romance onde Wilde exorta a plenitude das suas ideias e opiniões acerca da sociedade e do espírito humano.
O ambiente da obra está assim imbuído de homossexualidade. Todos os personagens principais são homens e é num trio deles que o romance se irá desenvolver.
Dorian Gray é um jovem de 20 anos que possui uma beleza desmedida, cuja é retratada por um amigo, o pintor Basil Hallward, que tem por ele uma paixão tal, que pinta o quadro de uma forma tão transcendente que todos ficam estupefactos com a exactidão da pintura, parecendo mesmo que Basil conseguiu captar a própria alma de Dorian.
No dia em que termina o quadro, encontra-se presente Lorde Wolton, homem extremamente inteligente e dono de uma ironia tão vasta, que irá influenciar de uma forma crucial Dorian Gray. Refiro que, quanto a mim, Lorde Wolton personifica o próprio Oscar Wilde. É assombrosamente semelhante o carácter de Wolton com o de Wilde e não é por acaso que é precisamente Wolton que disserta sobre vários assuntos.
Todos ficam estarrecidos com o trabalho de Basil, principalmente por ele ter conseguido captar a extrema beleza de Gray e, nessa altura em que fitava o quadro, Dorian articula um desejo: ”este quadro manterá o meu rosto jovem para sempre, enquanto eu irei envelhecer. Quem me dera que fosse o contrário”.
O livro segue então um rumo assente na promiscuidade entre esses homens, rodeados de opulência num desvario moral que já nos dá a perceber a nociva influência de Lord Wolton em Dorian Gray, que se começa a aperceber que, estranhamente, o quadro apresenta algumas alterações...
Começa dessa forma uma história excepcional, repleta de diálogos extraordinários e de várias alegorias.
É claro a intenção de Wilde em retratar o cinismo e a hipocrisia da aristocracia da época. Há toda uma série de alegorias que pretendem expor toda uma sociedade que se movia por interesses e com pouco ou nenhum respeito pelo próximo, apenas preocupados com as aparências e na ostentação social. Até o facto de o retrato envelhecer, mantendo-se Dorian Gray eternamente jovem, não é nada mais nada menos do que uma alegoria à decadência moral e espiritual dessa mesma sociedade, sempre tão sorridente e bonita, mas suja e podre por dentro.
Wilde brinca assim com toda a sociedade. Penso que foi precisamente por isso que a opinião pública ficou chocada com o romance e não com a insignificante alusão à homossexualidade.
Wilde atira ideias e teorias completamente irónicas, nota-se o sentido de espicaçar, de mostrar o ridículo, de denunciar.
Logo e devido ao desenvolvimento dessas ideias, este acaba por ser um livro não muito fácil de ler, pois é visível que cada diálogo tem um objectivo definido, uma intenção que ultrapassa um mero diálogo.
Muitos vêm este romance como uma elogio à beleza e à vaidade.
Eu admito que sim, mas afirmo que essa apologia é à própria sociedade e ao carácter da mesma, sobretudo ao carácter da burguesia do qual Wilde fazia parte.
O ”Retrato de Dorian Gray” é assim mais um estudo camuflado de romance, cheio de intenções e alegorias à sua sociedade e ao seu próprio circulo. Um romance que é injustamente um ícone da “cultura” homossexual, quando, e na realidade, pouco indicia sobre essa “cultura”.
Um romance soberbo que deve ser lido e analisado à luz da época em que foi escrito, sobretudo ao nível social.

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