segunda-feira, 10 de agosto de 2009

História das Lendas, de Jean-Pierre Bayard

TRECHO:
INTRODUÇÃO

A evolução constante da humanidade para
um fim inatingível influi sobre a vida do
indivíduo; as artes, expressão natural do homem ,
constantem ente modificada, seguem um a curva
que pretendem os ser ascendente.
Foi dito que tudo o que era estático, imóvel,
era atrasado; a evolução só deve ser dinâm ica.
Contudo, o estudo da evolução nos confunde
dada a som a de m istérios que surgem a todo
m om ento.
Parece paradoxal que hom ens, em épocas em
que a ciência era m enos adiantada do que a
nossa, tenham descoberto leis que apenas
encontram os. Contudo, as características das
grandes pirâm ides nos provam , de m aneira
irrefutável, que os egípcios conheciam os
segredos de fórm ulas que ainda não descobrim os
inteiram ente. Nossos rigorosos cálculos científicos
eram , sem dúvida, substituídos por outra ciência
tão precisa quanto a nossa.
Esta evolução ascendente torna-se, desta
form a, m enos positiva; crem os apenas que as
questões form uladas o eram de m aneira diferente;
é um a transform ação de energias. O m ar, com
seu fluxo e refluxo, pode, em certos m om entos,
fazer crer que evolui; contudo, perm anece com o é,
não enche sem vazante. Nossa lei de
transform ação torna-se então um a constante e a
contribuição de nossa atividade científica cuja
utilidade não é certa — é anulada pela nossa falta
de raciocínio. Num a civilização m ecanizada o
espírito acha-se cada vez m ais deslocado
Se nossos conhecim entos se m odificaram , a
inteligência continua a ser um bem im utável; não
se pode dizer que Einstein seja m ais inteligente
do que Pascal, m as apenas que Einstein resolveu,
em seu tem po, outros problem as. Einstein — ou
qualquer outro sábio — descobriu apenas o que
outros já haviam vislum brado, e quando diz que o
m undo está fechado, repete apenas o que o
Evangelho de São João Batista já nos ensinou.
A evolução do hom em continua pois a ser
um a m iragem e os grandes iniciados revelam ,
sim bolicam ente, algum as verdades cuja
veracidade controlam os com dificuldade. O
estudo de problem as hum anos, de raças, de
folclore; nos leva a crer que o hom em ,
anteriorm ente, tenha sido um iniciado m as que
seus conhecim entos se perderam . Algum as tribos
da África equatorial conservaram virtudes e
sentidos que já não tem os. Nossas sensações se
evaporaram . É assim que um ensinam ento geral
em ana dos contos e que toda essa poesia
anônim a, feita de graça e frescor, reflete a m esm a
preocupação.
Acontece que essa literatura coletiva, criada
pelo produto inconsciente da im aginação, pela
m assa, pretendia ser um testem unho, um a prova.
Não é absurdo pensar que os contos, antes
divulgados oralm ente e depois, por escrito,
provavam , apoiavam teses, argum entavam em
seu favor. Sob a form a de um divertim ento, a
fábula educava.
A m oral dessas fábulas é agradável,
engraçada; distrai pois não aborrece aquele a
quem se dirige.
O estudo do folclore m undial — que reflete a
atividade, o pensam ento de um a época e de um
povo — é pois o estudo da hum anidade. Essas
obras esclarecem períodos obscuros e suas
deform ações são instrutivas, pois nada m ais são
do que a evocação de m ores locais, de concepções
particulares e hum anas. A lenda, m ais verdadeira
do que a história, é um precioso docum ento: ela
exara a vida do povo, com unica-lhe um ardor de
sentim entos que nos com ove m ais do que a
rigidez cronológica de fatos consignados; desta
form a, o rom ance é a sobrevivência das lendas.
Im aginam os um a literatura científica na qual os
“robots” escrevem poem as; m as esses engenhos
m ecânicos nunca poderão transm itir em oções
iguais às contidas nos poem as de Villon ou de
Baudelaire, pois que as obras desses hom ens
eram feitas com sangue.
Além do m aravilhoso que envolve esses m itos
é preciso descobrir o tem a inicial que se reproduz
em países diferentes e m uito longínquos: essa
concepção nos leva a um a nova interpretação.
Esses contos m isteriosos fazem a Th. Briant
escrever (Le Goéland, n.o III) (A Gaivota): “cada
lenda podia ter um a explicação m ística no plano
de analogias e correspondências”, contudo, “as
identidades nos fogem e chapinham os no
Relativo”.
Alguns contos, assim tratados, m ostraram
aspectos de sua evolução e interpretação; é
evidente que estas sim ples páginas não esgotarão
o assunto.

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